sábado, 7 de novembro de 2015

Daniel HDR Animax Megaman Fanzines e vídeos em EP Quinta cast 06

domingo, 13 de setembro de 2015

VOLTA, MUTARELLI, VOLTA! OU NÃO...


Mais uma prova de que quadrinhos não são literatura é a matéria do site uol sobre Lourenço Mutarelli. Este, um autor que conheci em meados da década de 90 com a “trilogia em quatro partes” de Diomedes, um detetive muito escroto. Aquilo brilhou pra mim. Até hoje considero uma das melhoras obras que já li e a melhor hq nacional que conheço. Uma obra volumosa, densa, cheia de propostas estéticas. Propostas que poderiam incomodar os incautos, mas que agradaria aos curiosos.



Naqueles anos eu fazia uma feira de quadrinhos aqui no Piauí e resolvi que Mutarelli deveria ser um dos nossos convidados. Eu o procurei, achei um e-mail, entrei em contato, mas sua esposa respondeu e disse que ele não poderia ir. “Coisa de artista”, pensei. Hoje, parece-me que ele já não costumava ir a esses eventos, como não foi ao último Troféu HQ Mix, receber a homenagem que lhe fizeram. Um quadrinista que não faz mais quadrinhos e que dedica-se a outras áreas da arte. “A Lucimar Mutarelli irá me representar. Obrigado", escreveu ele à organização do HQ Mix, segundo a matéria do site Uol com o artista. Posso imaginar como se sentiram o pessoal do prêmio.



Enfim, Mutarelli desistiu dos quadrinhos. Ele disse que "o meio dos quadrinhos sempre me incomodou bastante. Os próprios quadrinistas mesmo. É um meio muito bitolado”. O autor fez teatro, namorou com o cinema, em filmes como a adaptação de O Cheiro do Ralo, mas antes disso havia se rendido à literatura.  Ele disse que “essa mudança veio não só pela literatura, mas também pelo meio literário, que me aceitou muito bem. Isso é uma coisa que me ganha. Aceitação verdadeira, não bajulação. No meio literário eu fui muito bem acolhido, isso foi uma coisa que foi muito importante para mim”. Fica evidente que o autor não foi bem aceito pelo meio dos quadrinhos. O que é uma pena. Perdemos uma referência que estava, talvez, no auge de sua criatividade. Foi rumar por outras linguagens porque fazer quadrinhos no Brasil é um tormento, o próprio autor disse que “no quadrinho, você precisa trabalhar no mínimo dez horas por dia desenhando. Escrevendo [romances], eu trabalho menos horas por dia, trabalho com muito mais prazer. E vivo também. Antes, eu não vivia, só trabalhava”. Essa é uma condição de crise para o mercado de quadrinhos no Brasil. Existe um grande esforço desse tipo de autor, o desenhista, que passa horas, às vezes dias, produzindo uma única página.



Mutarelli é um artista reconhecido e reclama-se abertamente da falta de recursos, “eu preciso é de dinheiro. Sou um cara totalmente falido”. Já li alguns textos sobre o mercado de quadrinhos no Brasil e é lugar comum encontrar referências de quadrinistas que tiveram de percorrer caminhos no design ou publicidade para puderem sobreviver.

Dessa história, fico com algumas reflexões: por que os quadrinhos no Brasil são um meio tão indigesto com seus artistas? Por que nossa arte sequencial teve de perder esse talento tão significativo para outros meios artísticos? Serão os quadrinhos um meio realmente tão “bitolado” a ponto de renegar a sobrevivência de um autor referência em seu próprio seio?

Mutarelli, cara, fica de boas!

Não quero aqui fazer um tratado sobre o mercado de quadrinhos no Brasil, apenas me indigno em saber que nos EUA, autores da literatura e de outras áreas, como Stephen King, George RR Martin e Orson Scott Card, migram e fazem sucesso com os quadrinhos,mas aqui no Brasil ainda vivemos em um meio onde si diminui os quadrinhos a um gênero qualquer de “subliteratura”, onde autores, para serem levados a sério, precisam escrever romances porque gibis não levam ninguém a lugar nenhum.

Revista Feira HQ no Catarse

Conheça um pouco mais sobre o projeto da Revista Feira HQ no Catarse

terça-feira, 8 de setembro de 2015

O descaso da Lei A Tito Filho


Há muito tempo hesitei em escrever sobre isso. Não escrevi. Quis dar tempo ao tempo. Enquanto uma porrada de conhecidos diziam: “Esquece isso! É dinheiro perdido”, eu continuava acreditando que uma hora daria certo, que o bom senso venceria e que a migalha prometida para projetos culturais seria entregue aos proponentes selecionados.

Mas vamos do princípio: tenho dois projetos aprovados na Lei A Tito Filho, um de 2009, intitulado “Quadrinhos Pós-68”, de R$17.107,00 e outro de 2012, chamado “Reanimando Arnaldo Albuquerque”, de R$ 22.573,00. São quase R$40mil. Parece muito? Não é! No edital de 2012 foram prometidos R$1milhão de reais, divididos para 35 projetos.

A informação que eu tenho é de que nenhum desses 35 projetos foram pagos, que, sequer, foram feitos os contratos entre os proponentes e a Fundação Monsenhor Chaves (FMC). Não estou afirmando isso de forma alheia. Lembro que fui, no começo de 2013, até à FMC perguntar sobre o porquê de eu ainda não ter sido chamado para assinar um contrato com eles sobre um dos projetos aprovados em 2012. A resposta que tive de alguém do setor jurídico foi: “porque ainda estamos devendo editais anteriores e não vamos fazer isso”. Ou seja, a FMC já estava devendo vários pagamentos de editais anteriores e não pretendia comprometer-se em mais R$1milhão com novos projetos. A questão é que o edital foi lançado em 2012 e 35 novos proponentes foram contemplados. É muita hipocrisia lançar um edital e depois dizer que “não podemos assinar com vocês o que prometemos”. Estavam lhes resguardando esse direito de não se auto incriminarem legalmente, afinal, sem um contrato assinado, pouco podemos fazer.

Mas a lista dos projetos aprovados em 2012 continua disponível no site oficinal da FMC. Aqui está o link.



Entretanto, ter um contrato assinado com a FMC não parece significar muita coisa, já que aquele órgão encarrega-se de perdê-los ou ignorá-los. Sim! A FMC perdeu meu contrato de 2009, perdeu o processo duas vezes, inclusive a prestação de contas que tinha feito da primeira parcela, recebida com quase 3 anos de atraso. Menos mal! Recebi uma parcela, prestei contas, mas não tenho mais expectativas em receber a 2ª e 3ª parcela, indispensável para a concretização do projeto (vale ressaltar que dividir os projetos em 3 parcelas já é ridículo por si só! Com o dinheiro previsto para minha 2ª parcela eu não poderia fazer nada, a não ser esperar o dinheiro da 3ª parcela para puder pagar o custo de impressão do meu livro, objeto do projeto).

Há algumas semanas fui ao escritório do presidente da FMC, o sr. Lázaro do Piauí, falar sobre isso. O projeto “Reanimando Arnaldo Albuquerque” está acontecendo por conta do esforço de pessoas como Neila Rocha e Maiça Chaves, ambas do Projeto de Ilustração e Animação – PIA – UFPI.  Elas estão arcando com todos os custos porque possuem todo o interesse pela arte do Piauí, cuidado esse que a FMC e a própria Prefeitura de Teresina não demonstram. Fui até lá explicar ao Lázaro que o produto do projeto Reanimando Arnaldo iria sair, inevitavelmente, mas que seria muito bom se a FMC fizesse valer o edital de 2012 e disponibilizasse os recursos previstos para que houvesse uma parceria entre todos nós que financiasse esse projeto e pudesse pagar toda a mão de obra envolvida. Acontece que o sr. Lázaro não é o responsável por desses editais, mas representa a instituição que os acometeu. Então, ainda espero que algo possa acontecer. Perdoem minha inocência.

Estive receoso de falar sobre isso desde o começo do ano porque em janeiro passado faleceu o Arnaldo Albuquerque, primeiro quadrinista a publicar no Piauí, e meus dois projetos aprovados na Lei A Tito Filho envolviam a arte dele.  Não quis parecer um oportunista utilizando a morte de Arnaldo como bandeira, mas quando penso que se os editais da FMC fossem levados a sério pelos gestores públicos, eu poderia ter homenageado este homem com dois produtos culturais sobre sua arte ainda em vida, e a indignação me sobressalta.

Por toda a arte que deixou de ser exposta ou produzida através da Lei A Tito Filho, por esses míseros R$1milhão de reais que parecem tão impossíveis para a cultura do município de Teresina, que desde 2012 parece ficar cada vez mais longe, espero que todos sintam vergonha. Todos! Inclusive eu.


Se você é um autor de projeto que esteja em situação parecida com a minha, proponho criarmos uma carta aberta e procurarmos algum tipo de processo coletivo, seja através do Ministério Público, seja por algum caminho que alguém conheça melhor que eu. Coloque nos comentários abaixo, seu nome, o nome e o ano do projeto que a Lei A Tito Filho está em débito com você.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

BABA HABIBI E BHABHA

Bernardo Aurélio de A. Oliveira (UFPI)[1]


RESUMO: O hibridismo cultural trabalhado por Homi K. Bhabha no livro O Local da Cultura pode ser percebido a partir do estudo da história em quadrinhos escrita e desenhada por Craig Thompson, intitulada Habibi. Ambos autores levantam questões relevantes sobre a formação de culturas, a construção de identidades de povos e de narrativas nacionais. A partir dos estudos de Bhabha e fazendo uma leitura de Thompson sobre os discursos de textos encontrados no Alcorão e na Bíblia, presente em Habibi, podemos perceber até onde aproximam-se, distam-se e misturam-se entre si as culturas maometanas e cristãs, sempre  traçando um paralelo entre as informações dos livros dos autores citados. Este artigo trata sobre a influencia da cultura islâmica sobre a vida ocidental cristã e vice-versa, utilizando o conceito de hibridização de povos e culturas característico das noções de “entre-lugar” definidos por Bhabha, bem como sobre os povos que vivem em situações de fronteira e sobre as raízes e ramificações de suas grandes narrativas nacionais religiosas originárias.

Palavras-chave: Hibridismo cultural, entre-lugar, nação.

Abstract: The cultural hybridity studied by Homi K. Bhabha in The Location of Culture can be seen in the work of Craig Thompson, Habibi. Relevant questions about culture formation in frontier situations and constructions of national narratives can be traced in parallel reading the books of authors cited.
Keywords: cultural hybridity, in-between, nation.

Não poderia deixar de começar explicando que este artigo é fruto de uma apresentação de seminário sobre Homi K. Bhabha, portanto, preciso antes de tudo, dizer que não poderia tê-lo escrito senão baseado nas anotações de Dalva Fonteneles e Jaislan Monteiro, colegas mestrandos e parceiros na apresentação do “O Local da Cultura como território de negociação: reflexões sobre a questão pós-colonial” durante última aula de Teoria da História, ministrada pelo professor Drº Edwar Castelo Branco. Dito isto, de alma limpa e com as anotações dos colegas em mãos transcrevo esse relatório em forma de artigo.
            Bhabha é daquele tipo raro de autor que torna-se unanimidade. Dono de um estilo forte e difícil de leitura, que não procura ser didático, pedagógico muito menos dono de uma verdade teórica que tenta impor-se a outras, é muito mais um autor que procura por em prática as teorias que o tornaram conhecido: como o hibridismo cultural. Portanto, preocupa-se em misturar o eu ao outro dos autores (como Fanon, Said, Foucault, Green) tornando seu pensamento uma terceira coisa fruto da fusão das duas partes anteriores. Tornou-se, de fato, “um dos principais arautos dos chamados teóricos pós-coloniais e do multiculturalismo, um atento pesquisador das minorias sociais e culturais” (EICHENBERG, 2012).
            Meu objetivo aqui é traçar um paralelo entre alguns desses conceitos e a história em quadrinhos Habibi, de Craig Thompson, obra que, por sinal, não fica à sombra de Bhabha, mesmo porque são de universos editoriais diferentes, mas o que quero realmente dizer é que “Habibi é um monumento do quadrinho moderno e uma resposta atual a questões que nos perseguem desde sempre”. Claro que essa citação foi retirada da orelha do livro, entretanto não sou o único a concordar com ela visto a quantidade de prêmios e elogios que o livro já recebeu[2]. Na minha opinião, Habibi é tão importante para os quadrinhos quanto O Local da Cultura é para a História, mas minha opinião aqui é quase tão imparcial quanto às citações das orelhas dos livros, portanto, Franz Lima, escritor e blogueiro dirá o que eu gostaria de dizer, assim fica mais impessoal:

São 672 páginas de arte em estado puro. Ilustrações belas, detalhadas e, ao mesmo tempo, simples na mensagem que passam. Não há excessos, apesar do refinamento da produção. O que vemos desde a primeira página é um fenômeno. A combinação de roteiro, letras, desenhos e, principalmente, um recado para um mundo cada vez mais crítico quanto aos islâmicos torna "Habibi" uma pérola de valor inestimável (2012).

            Elogios à parte, vamos ao que, de fato, interessa: Bhabha escreveu sobre o mundo pós-colonial em que vivemos e sobre as consequências dessa condição, “é um salutar lembrete das relações “neo-coloniais” remanescentes no interior da “nova” ordem mundial (...) Tal perspectiva permite a autenticação de histórias de exploração e o desenvolvimento de estratégias de resistência” (BHABHA, 2013,  p. 27). Segundo o autor, após a segunda grande guerra, as populações do mundo intensificaram as correntes de migrantes e refugiados, e sua pesquisa preocupa-se em entender esse mundo que desloca a questão da cultura para uma época em que populações diversas estariam nesse constante movimento, redefinindo limites fronteiriços em níveis mais psicológicos, sociais e culturais do que meramente geográficos. Então, esses homens fronteiriços levam consigo sua bagagem material e imaterial e traduzem-se na relação da diferença com o outro, o nativo. É preciso entender essa fronteira na perspectiva de Bhabha antes de voltarmos para o Craig Thompson e seu Habibi.
            “Uma fronteira não é o ponto onde algo termina, mas, como os gregos reconheceram, a fronteira é o ponto a partir do qual algo começa a se fazer presente” (HEIDEGGER apud BHABHA, 2013, p. 19). É com essa citação que Bhabha inicia a introdução de seu livro. Ele  nos explica que as fronteiras são lugares de articulação de diferenças que dão início a novos signos de identidade. É na relação fronteiriça entre o eu e o outro que nossas diferenças se revelam e nessa articulação existe uma troca que recria outro de nós mesmos. Essa articulação acontece no entre-lugar. Vide figura[3] abaixo.






Fig. 01. Relação entre eu e o outro que cria outros de nós mesmos devido ao entre-lugar (espaço intervalar).

           
            Esse encontro de partes é um espaço intervalar, de fronteira entre diferentes culturas. A simples existência desse tipo de espaço faz de nós seres múltiplos, diferentes das construções herméticas e homogêneas construídas pelas identidades nacionais, por exemplo. As grandes narrativas estatais constituem o povo “em objetos históricos de uma pedagogia nacionalista, que atribui ao discurso uma autoridade que se baseia no preestabelecido ou na origem histórica constituída no passado” (BHABHA, 2013, p. 237). Para essas narrativas pedagógicas, o conceito de muitos como um baseia-se na teoria que “trata gênero, classe ou raça como totalidades sociais que expressam experiencias coletivas unitárias” (BHABHA, 2013, p. 232). O que precisamos imediatamente perceber aqui é a sutileza dessas fronteiras que nos definem como seres plurais, diversamente dessa estratificação fixa e hierárquica que nos mutila em blocos de comportamentos culturais isolados, para isso, Bhabha cita René Green e seu exemplo do sótão, do poço e da escada “para fazer associações entre certas divisões binárias como superior e inferior, céu e inferno. O poço da escada tornou-se um espaço liminar, uma passagem entre as áreas superior e inferior” (2013, p. 23). Bhabha explica:

O poço da escada como espaço liminar, situado no meio das designações de identidade, transforma-se no processo de interação simbólica, o tecido de ligação que constrói a diferença entre superior e inferior, negro e branco. O ir e vir do poço da escada, o movimento temporal e a passagem que ele propicia, evita que as identidades a cada extremidade dele se estabeleçam em polaridades primordiais. Essa passagem intersticial entre identificações fixas abre a possibilidade de um hibridismo cultural que acolhe a diferença sem uma hierarquia suposta ou imposta (2013, p. 23).

            Tornamo-nos então seres híbridos e nessa condição implodimos qualquer conceito de identidade nacional cristalizada. Somos heterogêneos, precisamos perceber o outro de nós mesmos que nos tornamos ainda intra-uterinamente, quando nos dão nome e a cor do enxoval. Precisamos perceber nosso hibridismo cultural quando rezamos pra Jesus e para Todos os Santos ou quando comemos a comida típica de um país estrangeiro no restaurante da esquina. E tudo isso é reforçado no mundo pós-colonial, pois foi esta condição que mais propiciou as características de fluidez e transitoriedade moderna.
            Permitam-se a leitura de uma citação de minha autoria: dois quadrinhos de um fanzine que fiz chamado Babar o Bhabha e que serviu como recurso didático durante o Seminário que fizemos sobre O Local da Cultura. Fica mais fácil de engoli-lo se entenderem a imagem como um simples parágrafo, escrito por mim de maneira não-completamente-verbal.


Fig. 02. Quadrinhos de minha autoria publicado no fanzine Babar o Bhabha.
           
            O que tentei trabalhar nesses quadrinhos é um pouco do que Bhabha disse:

Estar no "além", portanto, é habitar um espaço intermédio, como qualquer dicionario lhe dirá. Mas residir "no além" é ainda, como demonstrei, ser parte de um tempo revisionário, um retorno ao presente para redescrever nossa contemporaneidade cultural; reinscrever nossa comunalidade humana, histórica; tocar a futuro em seu lado de cá. Nesse sentido, então, o espaço intermédio "além" torna-se um espaço de intervenção no aqui e no agora (…) o trabalho fronteiriço da cultura exige um encontro com "o novo" que não seja parte do continuum de passado e presente. Ele cria uma ideia do novo como ato insurgente de tradução cultural. Essa arte não apenas retoma o passado como causa social ou precedente estático; ela renova o passado, refigurando-o como um "entre-lugar" contingente, que inova e interrompe a atuação do presente. O "passado-presente" torna-se parte da necessidade, e não da nostalgia, de viver (BHABHA, 2013, p. 28 – 29).
           
            A relação entre passado e presente não é simples como uma linha narrativa cronológica prevê. Viver no mundo pós, é residir no além onde o passado é constantemente revisitado. Tanto é, que o passado torna-se presente. É quando uma tradição cultural pedagógica que estabelece uma identidade de nação-povo que foi sedimentada desde um passado remoto, torna-se uma prática renovada no cotidiano atual: é o passado vivo, renovado e performatizado pelas culturas híbridas modernas. É quando, por exemplo, o vaqueiro deixa o gibão de couro em casa, veste a calça jeans, monta na sua moto e leva a boiada através de uma estrada de asfalto.
            Diante do que já foi colocado, podemos voltar para Craig Thompson. Habibi conta a história de Dodola e Zam, dois escravos de uma cidade fictícia chamada Vanatólia, provavelmente uma referência a Anatólia, região do extremo oeste da Ásia, também conhecida como Ásia Menor, onde fica a Turquia. A península anatoliana é situada geograficamente como uma ponte entre a Ásia e a Europa, o que é muito curioso e oportuno para a análise neste trabalho, já que pontes podem possuir a mesma carga simbólica das escadas citadas por Green e Bhabha agora a pouco. É o ir e vir dos agentes entre os extremos da ponte que estimula o hibridismo cultural transformando o eu e o outro. Podemos imaginar que essa região fictícia da Vanatólia, se realmente foi inspirada na Ásia Menor, como parece, é um país de grandes fronteiras culturais, principalmente porque a história em quadrinhos pode ser entendida como um conto de fadas dos dias atuais “sobre a cultura e o comportamento das pessoas em um país tipicamente islâmico. Mas não se deixem enganar: Habibi é um conto de fadas como os antigos foram. Há força, impacto e verdade nos desenhos e palavras da Graphic Novel” (LIMA, 2012).
            Para não me alongar muito, Dodola foi vendida ainda criança para seu noivo, um escriba que costuma trabalhar em transcrições do Corão. Ela aprende a ler e escrever, vivendo bem com seu marido, apesar da diferença de idades: ela casou-se com 9 anos e ele, provavelmente, com 40. Um dia a casa é assaltada, seu marido morto e ela é levada por traficantes de escravos. Entre eles, conhece uma criança menor que ela, Zam, de quem decide cuidar. Eles conseguem fugir e vão morar no deserto. E a história deles dois alonga-se, maravilhosamente, por mais 600 páginas, pelas quais não posso nem devo me prender aqui. O que interessa agora são as histórias que Dodola narrava para Zam. Histórias dos princípios, de Deus, anjos, demônios e crentes. Histórias da Bíblia, histórias do Corão, narrativas primordiais de livros que identificam e unem povos-nações.
            Thompson deu uma entrevista especial para Ramon Vitral, publicado no jornal O Estado em janeiro de 2012, que traz informações importantes antes de entrarmos diretamente na análise de Habibi. Ramon faz questão de lembrar primeiro a experiencia católica do autor retratado em seu primeiro grande trabalho, o livro Retalhos, depois perguntou “como foi escrever sobre o mundo islâmico em Habibi tendo a formação cristã conservadora que teve?”

Esse foi o elemento que tornou mais acessível a escrita sobre o Islã. Interagindo com amigos muçulmanos, vi que a vida deles não era tão diferente do ambiente em que cresci. São os mesmos estilos de vida, as mesmas morais e, principalmente, as mesmas histórias como fundamentos de ambas as crenças. Foi o meu ponto de acesso. O Alcorão contém algumas das mesmas histórias da Bíblia, mas de forma menos linear e mais poética (THOMPSON apud VITRAL, 2012).
               
            Senhores, Craig Thompson não poderia ter nos proporcionado uma resposta melhor. Fica evidente a questão do entre-lugar, do hibridismo cultural, a percepção das diferenças fronteiriças e das semelhanças dos mitos originais que fundamentam nações inteiras ao redor do mundo. Não contentando-se com uma resposta tão oportuna como essa, parece-me que Thompson sabia que alguém escreveria sobre ele um dia sob a ótica de Bhabha, afinal de contas, leiam o que ele disse, dia 28 de julho de 2012, ao repórter André Miranda, do jornal O Globo quando perguntado se acha que a origem do fundamentalismo religioso é a mesma no Ocidente e no Oriente:

Eu acredito que sim. Os fundamentalistas são os mesmos, assim como são os mesmos os seguidores eventuais de ambas as fés. Cristãos eventuais não são necessariamente conservadores ou dogmáticos, e o mesmo se aplica ao muçulmano comum que você pode encontrar na rua. Eu acho que a reação anti-Islã que surgiu nos Estados Unidos depois do 11 de Setembro nasceu em grande parte de um auto delírio, uma forma de atacar a mesma intolerância religiosa que existe em nós mesmos. O grande tema de Habibi é que esses rótulos — cristão e muçulmano, homem e mulher, Oriente e Ocidente — são simplesmente fronteiras imaginárias que precisam ser descartadas (THOMPSON apud MIRANDA, 2012)

            Os binarismos cristão x mulçumano, homem x mulher, oriente x ocidente “são simplesmente fronteiras imaginárias que precisam ser descartadas”. Lembram da figura 01? Percebem que o resultado do encontro eu x outro é uma imagem esmaecida, enevoada? Não é meramente ilustrativo: o resultado dessa colisão dicotômica é um abrandamento das percepções das diferenças via de regra a percepção e o “achamento” do entre-lugar. É perceber que essas fronteiras são, de fato, imaginárias, como disse Thompson. Tudo isso é muito importante porque perpassa as opiniões de Bhabha, que desde o início de seu livro preocupa-se em colocar sua teoria como forma de minorar os problemas entre-nações. É dele a seguinte citação:

Os próprios conceitos de culturas nacionais homogêneas, a transmissão consensual ou contínua de tradições históricas, ou comunidades étnicas "orgânicas" - enquanto base do comparativismo cultural-, estão em profundo processo de redefinição. O extremismo odioso do nacionalismo sérvio prova que a própria ideia de uma identidade nacional pura, "etnicamente purificada", só pode ser atingida por meio da morte, literal e figurativa, dos complexos entrelaçamentos da historia e por meio das fronteiras culturalmente contingentes da nacionalidade [nationhood] moderna (BHABHA, 2013, p. 25).
           
            Bhabha percebe que a cristalização de uma cultura e a pedagogia de uma política nacional pura e autoritária termina por sérios problemas como o extremismo na Sérvia ou o drama do “teatro contemporânea do Sri Lanka” (2013, p. 25).  Por várias vezes, Thompson foi perguntado se a escolha temática de Habibi, de lidar com o povo islâmico num mundo pós-11 de setembro. Eis o que ele disse ainda na entrevista a André Miranda:

Depois do 11 de Setembro houve uma grande islamofobia na mídia americana, e, em parte por isso, eu quis olhar dentro do Islã para melhor compreendê-lo e poder reconhecer suas belezas. Também percebi que eu não tinha amigos muçulmanos, e trabalhar em “Habibi” me permitiu conhecer novas pessoas e ganhar novas amizades. Muitos dos diálogos do livro vieram de conversas que tive com novos amigos que fiz (THOMPSON apud MIRANDA, 2012).
           
Em outra entrevista ao jornal O Globo, dessa vez cedida a Telia Navega ainda 2009, perguntado se suas motivação para Habibi seria o desejo de humanizar a cultura islâmica depois do 11 de setembro, ele disse:

Esse pode ter sido meu impulso inicial, por minha frustração com relação ao comportamento da América pós 9/11, mas “Habibi” acabou saindo mais como um conto de fadas. Ela usa detalhes da cultura islâmica e toma emprestado seu ritmo de contar histórias, como em “As mil e uma noites”. É uma história de amor entre duas crianças escravas, sexualmente abaladas, com desertos, haréns e favelas como cenário. É seco, espiritual e sexual. (THOMPSON apud NAVEGA, 2009).

            Então, Habibi não é uma resposta direta ao 11 de setembro, é um conto de fadas moderno “como os antigos foram”, nas palavras de Franz Lima já citadas aqui. É uma grande história que aborda questões sobre capitalismo e acúmulo de riquezas (como a água nos haréns do sultão), o amor, o espírito e o sexo, além de questões ambientais. Mas nos concentraremos em uma narrativa envolvendo os povos do livro, presente nessa obra.
            Para os cristãos acostumados com o Gênesis é sabido que Isaque, filho de Abraão com Sara foi levado pelo pai a um local de sacrifício a mando de Deus. Entretanto, para a narrativa islâmica, Abraão teria tido um filho com Agar, escrava entregue a ele pela própria esposa, e ao filho deram o nome de Ismael. Atentem-se às próximas ilustrações:



Fig. 03: THOMPSON. 2012. p.47

            Como podem ver, Thompson cita o mesmo fato sob dois pontos de vista, mostrando não apenas a diferença entre as religiões, mas as semelhanças embrionárias de onde ramificaram as narrativas que deram origem a seus povos. Fica ainda mais claro:


            Fig. 04: THOMPSON. 2012. p.618

            De Ismael até Maomé ou de Isaque até Cristo. “Qual foi o filho?”, pergunta Thompson (2012, p. 48). Quem Abraão levou para o “abate”? Qual a verdadeira história? Qual o verdadeiro Messias e, consequentemente, qual o povo escolhido por Deus? Não cabe a mim, como historiador, tentar provar qual a verdade, porque isso envolve, mais do que evidências históricas e provas materiais, questões de fé e de vivência espiritual que estão muito além das narrativas que eu, ou pesquisadores mais eficientes, possamos traçar. E digo isso baseado na teoria de Bhabha:

O que é teoricamente inovador e politicamente crucial é a necessidade de passar além das narrativas de subjetividades originárias e iniciais e de focalizar aqueles momentos ou processos que são produzidos na articulação de diferenças culturais. Esses "entre-lugares" fornecem o terreno para a elaboração de estrategias de subjetivação - singular ou coletiva - que dão início a novas signos de identidade e postos inovadores de colaboração contestação, no ato de definir a própria ideia de sociedade (BHABHA, 2013, p. 20).

            Com essa citação quero dizer que não é a procura da verdade subjetiva originária o que deve interessar ao historiador hoje, mas sim problematizar a articulação da diferença. Alguém pode dizer que Ismael foi inventado quase 700 anos depois de Cristo. Se uma coisa é verdade e outra é mentira, mesmo a busca pela verdade histórica devendo ser sempre a utopia do historiador, o que mais interessa hoje é perceber como essas narrativas se elaboram e quais estratégias montam para redefinir a sociedade que constroem, é entender como o discurso dessas histórias constroem as narrativas dos povos-nações. Tudo isso torna-se mais interessante quando percebemos que o resultado e a moral dessas histórias, tanto na Bíblia quanto do Corão, são semelhantes, reencontrando novamente um fato em comum. No caso de Ismael ou Isaque, Maomé ou Cristo, Thompson responde a pergunta com o que  há de comum nessas narrativas: qual das crianças foi executada? Nenhuma. “O anjo Gabriel trouxe um carneiro para ser oferecido no lugar deles” (2012, p. 646).
            Um outro ponto que me chamou a atenção que fiz na leitura de Habibi com olhos de Bhabha, foi a discreta passagem onde Dodola caminha pelo centro de Vanatólia, uma cidade “tipicamente” árabe, mas hibridizada com elementos ocidentais: as vitrines com biquines ou moda íntima, as motocicletas, os letreiros luminosos, as gravatas, os ternos. No meio de toda a movimentação ela percebe mulheres vestindo shorts e saias, deixando os cabelos soltos em um grande contraste ao que imaginamos ser os hábitos das mulheres árabes. Sentindo-se confortável com isso, Dodola baixa o véu, mostrando os cabelos, e continua a andar pelo comércio (fig. 05), mas logo em seguida é abordada de forma grosseira por homens no meio da rua (fig. 06), provavelmente julgando-a uma mulher “promíscua”, como devem parecer as mulheres ocidentais aos olhos daqueles mais fundamentalistas islâmicos.

Fig. 05: THOMPSON. 2012. p.615


Fig. 06: THOMPSON. 2012. p.616

            A passagem lembrou-me novamente Bhabha, que disse o seguinte durante uma entrevista ao jornal O Globo:


Nenhum indiano estava no tempo ou no lugar, na condição de cidadania, para poder considerar o que estava acontecendo a eles. Eles negociaram a situação. Eles tinham um modo de absorver certas ideias progressistas do Ocidente, porque se davam conta de que certas ideias de modernidade melhoravam o seu mundo. Eles aceitavam a modernização, mas não necessariamente a bagagem ideológica, ética ou dos costumes da ocidentalização. É dessa experiência, acho eu, que advêm tanto o meu conceito de hibridização como o de cosmopolitismo vernacular (2012).

            Ora! Dodola viu que andar de cabelos soltos era “bom”, e decidiu absorver essa ideia “progressista” do ocidente. Não cogitou, entretanto, que as pessoas ao redor não aceitariam a bagagem ideológica que isso acarretaria. Essa discreta passagem no meio de tantas páginas da obra Habibi nos apresenta novamente todo o conflito de que nos fala Bhabha sobre a vivência dos povos fronteiriços, que é comum ao hibridismo cultural.

            Ainda tomando como exemplo essa passagem de Habibi, voltamos novamente à entrevista de Bhabha ao jornal O Globo, quando ele conta uma historinha sobre uma moça que encontrara dentro de um trem:

Era uma jovem coberta por um véu, apenas os olhos aparecendo. As faces de todas as demais pessoas estavam à vista, e aquilo me chocou. E minutos depois o trem pára e ela se levanta para sair. Quando passou por mim, olhei e descobri que as suas costas estavam completamente à vista. E ela usava uma calça jeans que chegava até as suas ancas, e tinha uma pequena tatuagem. Mas seu rosto estava mascarado. Duas coisas eram claras para mim. Primeiro, que na nossa cultura sempre parecemos querer colocar todos os tipos de comportamento na panela maior da identidade. A maneira de se vestir, de falar, tudo tem de formar uma noção composta de identidade, aí nos sentimos seguros. Acho que isso é o problema real nesse caso. Segundo, não devemos ler essas coisas como marcas de identidade, mas como mensagens misturadas, diferentes. De um modo engraçado, esse era o direito da jovem de brincar com os diferentes tipos de linguagens, expectativas, normas e códigos de uma esfera pública metropolitana pós-migração ou da diáspora (2012).

            A grande diferença entre essa história de Bhabha e a passagem de Habibi é que uma se passa em Vanatólia, uma ponte cultural entre ocidente e oriente[4], e a outra se passa em Berlim, um grande centro cosmopolita ocidental. Bhabha impressionou-se com o véu cobrindo o rosto da moça no vagão do trem porque era diferente do contexto cultural alemão onde estava e, talvez por isso, a moça não se deixou intimidar como Dodola e vestiu o véu, mas deixou as costas à mostra, vestindo também uma calça jeans que mostrava suas “ancas”. Evidentemente, Bhabha não reagiu de forma grosseira como os homens do mercado em Habibi em relação à estonteante moça de costas nuas senão vestida apenas com uma discreta tatuagem, mas muito provavelmente soube apreciar o hibridismo misterioso da moça de rosto coberto e de outras partes à mostra... Se era, ou não, uma forma engraçada da moça lidar com os códigos metropolitanos de uma lógica migratória pós-colonialista, só podemos afirmar que Bhabha está certo quanto ao hibridismo cultural e que a moça, apesar de poder “chocar” as pessoas do vagão, não sofreu nenhum tipo mais grave de represália por seus modos, pois a mistura dos povos evidencia as diferenças, mas abranda os conflitos.
            Ainda existem muitos elementos importantes que poderiam ser identificados e cruzados entre Bhabha e Habibi, mas deixo minha contribuição por aqui e espero ter despertado o interesse para que outros colegas possam traçá-las.

 

Referências


EICHENBERG, Fernando.  Homi Bhabha e o valor das diferenças. Disponível em: < http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2012/01/14/homi-bhabha-o-valor-das-diferencas-426300.asp> Publicado em 14 de janeiro de 2012. Acesso em 03 de agosto de 2013.

LIMA, Franz. Resenha da Graphic Novel "Habibi" de Craig Thompson. Disponível em: <http://apogeudoabismo.blogspot.com.br/2012/09/resenha-da-graphic-novel-habibi-de.html> Publicado em setembro de 2012. Acesso em 03 de agosto de 2013.

VITRAL, Ramon. Craig Thompson fala sobre os oito anos de criação de 'Habibi'. Disponível em: http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,craig-thompson-fala-sobre-os-oito-anos-de-criacao-de-habibi,817622,0.html > Publicado em 02 de janeiro de 2012. Acesso em 03 de agosto de 2013.

MIRANDA, André. Política, religião e amor em quadrinhos: entrevista com Craig Thompson. Disponível em: http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2012/07/28/politica-religiao-amor-em-quadrinhos-entrevista-com-craig-thompson-457500.asp > Publicado em 28 de julho de 2013.




[1]Mestrando em História Cultural pela UFPI, com o Projeto “Salão de Humor do Piauí: Uma história de risos e cabelos brancos”, bernardohq@hotmail.com.
[2]Nos Estados Unidos, o prêmio Eisner é o mais importante dado às histórias em quadrinhos. Habibi foi indicado à categoria de Melhor Álbum de 2012, mas não levou. Craig Thompson, o autor, entretanto, ganhou o prêmio na categoria Melhor Escritor/Ilustrador por este trabalho. No Brasil, Thompson ganhou o HQMix de 2013 como Melhor Desenhista Estrangeiro por Habibi.
[3]Agradecimento especial ao colega Jaislan Monteiro, por ceder, mesmo sem seu conhecimento, o uso da imagem criada por ele para sua explicação sobre Bhabha durante seminário.
[4] Como convencionamos acreditar, Vanatólia seria uma alusão à península anatoliana.

terça-feira, 14 de abril de 2015

QUADRINHOS COMO LINGUAGEM, RECURSO DIDÁTICO E OBJETO DE PESQUISA

Bernardo Aurélio de Andrade Oliveira

Resumo: As histórias em quadrinhos são imagens que podem ser lidas como qualquer texto. Assim como o texto verbal possui um vocabulário e uma gramática, as histórias em quadrinhos, da mesma forma que os demais textos não-verbais, possuem um conjunto de elementos que podem ser transcodificados e compreendidos. Quando apreendida, essa gramática visual pode ser aplicada.

Palavras-chave: texto verbal, texto não-verbal, gramática, história em quadrinhos, escola.

INTRODUÇÃO

            Recentemente recebi uma proposta de fazer um minicurso sobre histórias em quadrinhos (HQs) dentro da programação de uma semana de história de uma Faculdade em Teresina. Meio receoso, porque nunca havia ministrado algo com 20 horas/aula de duração, aceitei a proposta. O primeiro passo foi folhear alguns dos livros que tenho e que já li sobre o tema abordado: Quadrinhos como linguagem, recurso didático e objeto de pesquisa. Procurei também alguns textos que já havia produzido ou auxiliado na produção, procurando elaborar meu próprio material a ser trabalho em sala de aula. Eis-lo aqui! Divirtam-se!
            O título deste texto, e do referido minicurso, sugere a linha que deveremos percorrer em nossa discussão, partindo do pressuposto dos quadrinhos como linguagem, entretanto, precisamo ter como ponto inicial uma simples definição: o que são história em quadrinhos? Segundo Scott McCloud, em “Desvendando os Quadrinhos”, tratam-se de “imagens pictóricas e outras justapostas em sequencia deliberada destinadas a transmitir informações e/ou a produzir uma resposta no espectador” (2005. pg 09). Na verdade, Scott tentou esmiuçar o termo “arte sequencial” , criado por Will Eisner em seu livro “Quadrinhos e Arte Sequencial”, que é um estudo básico para qualquer discussão sobre quadrinhos hoje em dia.  Scott e Eisner construíram a base teórica ocidental dos quadrinhos.
            Partindo desta definição, as HQs são bem mais que apenas as revistinhas que encontramos nas bancas de jornais. Scott cita, entre vários outros exemplos de quadrinhos, as pinturas rupestres das cavernas, manuscritos pré-colombianos incas e maias, a Coluna de Trajano, as pinturas e os hieróglifos egípcios, as ilustrações que acompanhavam os trovadores medievais e, por fim, às publicações que surgiram com a evolução da imprensa no século XIX.
            Todas essas imagens, da pré-história à idade moderna, eram arte sequencial, ou seja “um conjunto e uma sequencia. O que faz do bloco de imagens uma série é o fato de que cada quadro ganha sentido depois de visto o anterior; a ação contínua estabelece a ligação entre as diferentes figuras. Existem cortes de tempo e espaço, mas estão ligados a uma rede de ações lógicas e coerentes” (MOYA. 1977. pg 110).
            As HQs, como as conhecemos hoje, são frutos da revolução industrial, da imprensa, e da comunicação de massa. Elas tornaram-se um produto publicado dentro dos jornais, depois ganharam espaço próprio (revistas e livros) e, por fim, foram aceitas como arte, tendo sido reconhecidas seus elementos próprios de linguagem e comunicação.
            Uma curiosidade importante é a denominação que damos para os quadrinhos ao redor do mundo. Nos Estados Unidos os primeiros quadrinhos eram tiras de humor que tinham no cômico sua principal ferramenta. Por isso, os quadrinhos foram chamados de Comic por lá, e assim são denominados até hoje. Na Itália são chamados de fumetti, que significa fumaça, que na verdade são os balões que saem da boca dos personagens onde estão suas falas. No Brasil e na Espanha eles são chamados por um nome que eram títulos de uma publicação do gênero que ficaram famosas na primeira metade do século XX, respectivamente Gibi e TBO. Em Portugal e vários outros países da Europa, são chamadas de Banda Desenhada, porque “banda” é como são chamadas as pranchetas ou páginas utilizadas para o desenho. Mangá, o termo para quadrinhos em japonês significa algo parecido com o comic norte-americano. Trata-se de dois kanjis que se traduzem como “desenho humorístico”.
            É importante que saibamos que quadrinhos são uma arte em si, da mesma forma que cinema é cinema e teatro é teatro, exatamente por causa de seus elementos linguísticos. Digo isso por causa de um mal entendido muito comum, os que pensam que quadrinhos são literatura. Não! Quadrinhos possuem uma linguagem verbal e não-verbal. Vejam o que diz Paulo Ramos:
Chamar quadrinhos de literatura, a nosso ver, nada mais é do que uma forma de procurar rótulos socialmente aceitos ou academicamente prestigiados (caso da literatura, inclusive a infantil) como argumento para justificar os quadrinhos, historicamente vistos de maneira pejorativa, inclusive no meio universitário.
Quadrinhos são quadrinhos. E, como tais, gozam de uma linguagem autônoma, que usa mecanismos próprios para representar os elementos narrativos. Há muitos pontos comuns com a literatura, evidentemente. Assim como há também com o cinema, o teatro e tantas outras linguagens.(RAMOS. 2009. pg 17).

            Essa questão levantada por Ramos é recorrente porque quadrinhos ainda estão firmando sua condição de arte. É bastante comum em editais de apoio à cultura, ou mesmo nos PCN, os quadrinhos serem avaliados como literatura. Essa confusão se dá, basicamente porque quadrinhos são considerados um gênero literário, como o conto e a poesia. Outro fator que incentiva essa confusão são as adaptações de obras literárias para os quadrinhos. Da mesma forma que o cinema adapta um “Bras Cubas” de Machado de Assis e continua sendo cinema, uma história em quadrinhos que adapta a mesma obra continua sendo quadrinhos, e não literatura.

A LINGUAGEM DOS QUADRINHOS

            Certo, quadrinho é arte sequencial. É narrativa gráfica. Isso quer dizer que são imagens ligadas entre si através de cortes que dão a impressão de continuidade entre elas. Essa continuidade é o que dá narrativa e noção de tempo e espaço aos quadrinhos.
            É fundamental entendermos um dos pontos que considero dos mais importantes nos quadrinhos, que é o que há entre essas imagens sequenciadas, chamado de “entre-quadros” ou “calha”. Esse espaço entre as imagens, às vezes (na maioria delas), é bem definido por uma diagramação, ou lay-out, clássicos, onde os quadros estão bem divididos sobre um fundo branco. Às vezes o requadro, o “quadrinho” em si, nem existe, pois as imagens são articuladas de maneira a apenas sugerir este entre quadros invisível, como em uma cena de caça numa pintura rupestre que se estende por toda uma parede dentro de uma caverna: imagens seqüenciadas que narram uma história em momentos diferentes, mas que não possuem o quadrinhos em si, porque o entre quadros, o que divide um momento do outro, esse instante invisível que construímos em nossas cabeças, é mais importante do que a linha que forma o requadro, o quadrinho, o recorte. Enfim, é neste espaço, nesta calha, que acontece um processo fundamental na cabeça do leitor: o movimento, a transação, a percepção do tempo e do espaço. O leitor cria isso. Ele precisa compreender o que acontece aí. Mentalmente, o quadrinho se transforma em algo parecido com um filme, principalmente quando podemos imaginar o som das coisas também.
O som nos quadrinhos possuem um elemento muito forte, que são as onomatopéias: BUM! CABRUM! CRASH! SMAC! Essas coisas... Já pararam para pensar em como funciona a leitura desse som em nossas cabeças? Como esse som que é produzido e impresso numa folha de papel e executado por nós? O som ambiente de uma rua? O burburinho das pessoas num local cheio de gente? A voz fanha ou grave de um personagem? A música que toca e cria atmosfera? Essas coisas existem nos quadrinhos e nós, como leitores, precisamos perceber isso para consumirmos plenamente sua narrativa.
            As onomatopeias são representações de sons que, normalmente não conseguimos pronunciar. Dessa forma, um “BUM!”, que significa uma explosão dentro deste vocabulário sonoro que conhecemos, representa bem mais que um simples “BUM”. E experiência estética só é completa se reconhecermos as potencialidades que esse som pode representar, se tivermos e pudermos acionar nossa memória sonora. Em nossa cabeça, esse “BUM” terá a força de uma pequena explosão de espoleta ou de uma bomba atômica principalmente devido à forma como a onomatopéia assume como imagem. É a forma do desenho da onomatopéia que nos fornecerá elementos para interpretarmos o som que elas representam. Da mesma forma se dá com o texto falado. Vejam essa ilustração de Will Eisner:



            Percebem como a fonte utilizada no texto é fundamental para transmitir um sentimento que o personagem expressa? Claro que a contextualização do desenho do personagem é importante para entendermos a mensagem, mas eu posso interpretar o que vejo da seguinte forma: O velho tem ódio e terror nos olhos. Está amaldiçoando alguém. Você percebe que o velho está sangrando, da mesma forma que suas palavras. Palavras que, dispostas da maneira que estão, ocupando o espaço do mesmo tamanho do personagem, todas caixa alta, fazem parecer que ele está gritando, com uma voz tremula e medonha, mesmo com a ausência do balão.
            Como eu dizia, quadrinhos são essencialmente imagens, claro que, na maioria da vezes, as imagens são seguidas de textos verbais. Essas imagens podem ser desenho, pintura, gravura, fotografia, uma série de coisas. A forma como elas são ordenadas, objetivando narrar algo, é o que torna essas imagens uma história em quadrinhos. Essas imagens criam textos não verbais. Muitas HQs não possuem letras, por isso é necessário entender o texto, a mensagem que é transmitida, através, unicamente, da imagem. É importante educar o leitor, familiarizando-o com a interpretação das imagens.
            O relacionamento dessas imagens exige do leitor experiências que o permitam compreender as imagens. É sabido que as pessoas só reconhecem imagens se lhes for fornecido uma bagagem cultural que o permita interpretá-las. É preciso ensinar ao leitor sobre o que ele está vendo. Ele entende o que vê numa página de quadrinho? Que interpretação ele é capaz de fazer? Interpretar quadrinho é interpretar textos.
            O processo de leitura de um texto pode acontecer naturalmente quando o leitor observa ou atenta com cuidado um determinado objeto. Pressupondo que este objeto seja entendido como um texto, nossa mente, com esforço e ferramentas certas, é capaz de decodificar elementos que o compõe e então nós poderemos entender sua mensagem. Esse processo é bem simples de compreender quando o objeto em si trata-se de um texto verbal, pois normalmente estamos familiarizados com a gramática e seus ícones fonéticos que compreendemos desde o início de nossa alfabetização. Mas isso também acontece quando tentamos entender uma imagem que não seja notoriamente uma letra de um vocabulário conhecido, podendo ela ser um desenho, uma pintura ou uma fotografia, ou mesmo um gesto, um movimento. Essa imagem trata-se de um texto não-verbal.
            Compreender uma imagem requer conhecer também os ícones de sua gramática específica, mas qual a gramática de um texto não-verbal? Ela existe? Pode existir? Entendemos que sim, entretanto, não buscamos definir uma gramática completa do texto não-verbal. Precisamos entender a construção e o desenrolar da linguagem das histórias em quadrinhos (HQs), compreender sua narrativa, seu tempo, e a espacialidade que essas obras nos apresentam. Entender o processo de leitura de textos que praticamos ao folheá-las.
            Para que compreendamos esses mecanismos é preciso que formalizemos uma gramática da imagem. Necessariamente uma gramática mais flexível que qualquer outra, afinal, o texto não-verbal, a imagem pictórica, por mais concreta que seja, ainda permite uma gama variável de interpretações, pois seus ícones não são tão fáceis de si identificar como uma letra “a”.
            As letras de um texto são imagens, mais precisamente “signos lingüísticos”. A imagem que forma a letra “a” pode não dizer muita coisa de forma isolada, sem contextualização ou conceito maior que o da própria fonética, mas quando estes signos unem-se a outros, formam um significado mais amplo. A leitura destes textos produz, na maioria dos casos, um resultado imagético, o leitor consegue visualizar mentalmente o que o texto descreve. O texto é um código que precisa ser interpretado. Quando escrevemos, codificamos. Quando desenhamos, também.
            Existe uma proximidade muito grande entre escrever e desenhar, entretanto, é impressionante o número de pessoas que possuem uma caligrafia belíssima, mas não sabem desenhar um “olho”. Você já tentou desenhar um “a” bem grande numa folha? Não é tão simples como possa parecer. Para muitos desenhistas é muito mais fácil fazer um “olho”. Escrever é como desenhar. A letra é um desenho, formados de linhas ou pinceladas.



Fig. 01

           
Como você pode simplesmente identificar o conjunto de linhas acima como o fonema “a”? Como você imagina um som partindo de algo tão simples? Da mesma forma, ao observarmos as imagens abaixo, identificamos elementos, transcodificamos a mensagem e entendemos o “olho”.


Fig. 02

            Qual dessas imagens possui mais informações? Qual a mais difícil de ser compreendida? A primeira, uma imagem/texto verbal, exige o conhecimento da gramática para ser decodificada. As duas seguintes, imagens/textos não-verbais, necessitam de outro conhecimento para também serem traduzidas, entretanto, em todos os casos é preciso linguagem para que sejam produzidas. A linguagem influencia muito a informação. No exemplo em questão, a palavra, o desenho e a fotografia abordam o mesmo tema, entretanto, por se tratarem de linguagens diferentes, é impossível determinar qual é mais difícil de compreender ou qual possui mais informações, porque isso depende do leitor.
            Alberto Manguel, autor do livro “Lendo Imagens”, nos adverte de que todo texto é preconcebido em imagens do autor, que todo processo de pensamento requer imagens (2006. Pg. 21), o que reforça nossa compreensão de que os textos verbais podem ser sempre visualizados em outros códigos que não a própria “letra”. Manguel afirma ainda que “a existência se passa em um rolo de imagens que se desdobra continuamente” (2006, p. 21).
            Will Eisner, em seu livro “Quadrinhos e Arte Seqüencial”, nos revela a relação direta entre as representações fonéticas em suas imagens:

As palavras são feitas de letras. Letras são símbolos elaborados a partir de imagens que têm origem em formas comuns, objetos, posturas e outros fenômenos reconhecíveis. Portanto, à medida que o seu emprego se torna mais refinado, elas se tornam mais simplificadas e abstratas (EISNER., 2001, p.14).

            Para exemplificar melhor, ilustra a citação:


Fig.03. Eisner. 2001. p. 15

           
            Se pudermos entender a proximidade dessa relação entre o texto escrito e a “realidade” em si que a originou, se entendermos que todas as imagens criadas são apenas representações de uma realidade codificada, poderemos então fazer também o processo inverso e entender como esses textos não-verbais podem ser interpretados e poderemos ensinar às pessoas a aprenderem a ler as informações contidas nas imagens não-verbais.
            Nos casos acima, podemos entender como a imagem de um homem de joelhos pode ser interpretado como um “símbolo básico de devoção”. Entretanto, Eisner também nos lembra (2001, p.15) que um homem de joelhos também pode significar um pedido de clemência ou de casamento. O que nos leva à considerar sempre o contexto da imagem (texto não-verbal), da mesma forma que acontece com o texto verbal.
            Como bem sabemos, a gramática é um manual de normas e regras que estuda a relação entre as palavras e seus significados e ela é fundamental para qualquer texto, entretanto, no processo de comunicação, há controvérsias quanto a sua importância. Muitas pessoas, a grande maioria delas na verdade, se comunicam sem entender realmente como essa gramática funciona, mas ela existe e se adapta com o passar dos tempos, das relações e das formas de expressões. Traduzir estes textos verbais, ou melhor, transcodificar a mensagem das letras para um outro meio, para um meio imagético, é um processo que precisamos fazer cotidianamente se quisermos nos comunicar: transformar o verbal em não-verbal. É mais preciso que visualizemos a mensagem do que entendermos como sua gramática funciona.
            É comum alguém dizer que determinado texto é tão plenamente descritivo que chega a ser fotográfico. Ler é como estar vendo. Essa pessoa consegue visualizar o texto porque possui as ferramentas adquiridas durante sua vida que o permite interpretar os códigos. “Só podemos ver as coisas para as quais já possuímos imagens identificáveis, assim como só podemos ler em uma língua cuja sintaxe gramática e vocabulário já conhecemos” (MANGUEL, 2006, p. 27). Se se lê “minha terra tem palmeiras onde canta o sabiá” e caso o leitor não conheça um sabiá, ele não poderá fazer uma leitura correta do texto, pois talvez ele sequer saiba que se trata de um pássaro. Pode até deduzir. Mas que pássaro é este? Da mesma forma, alguém pode ver uma foto de um pássaro e dizer apenas ser um pássaro dentre tantos que existem, ele não reconhece que aquele é um sabiá. A informação, em ambos os casos, estará incompleta.
            A gramática nos ensina a interpretar de alguma maneira o texto e, como já sabemos, a letra é uma imagem, mas o texto também está presente em outras imagens, seja ela uma pintura, uma fotografia ou um desenho. Baseando-nos nessa proximidade do texto escrito e visual, esta gramática da língua pode nos ajudar a ler essas outras imagens? Será necessário ou possível criar uma gramática visual, diferente da verbal?
            Will Eisner aborda curiosamente esta questão num exemplo claro desta gramática visual:
A descrição da ação nesse quadro pode ser esquematizada como uma sentença. Os predicados do disparo e da briga pertencem a orações diferentes. O sujeito do “disparo” é o vilão, e Gerhard Shnobble é o objeto direto. Os vários modificadores incluem o advérbio “Bang, bang” e os adjetivos da linguagem visual, tais como a postura, o gesto e a careta.
O segundo quadro conclui o subenredo, e novamente usa a linguagem do corpo e a organização do padrão gráfico para delinear os predicados. (2001, p. 10)




Fig.04. Eisner. 2001. p. 09

            Trata-se de uma análise sintática da imagem, colocando cada termo ou elemento do texto em sua exata posição. Eisner provou que isso é possível em uma história em quadrinhos que, afinal, possui narrativa textual, tempo, ações, orações por assim dizer. Entretanto, esta aplicação ainda é superficial na interpretação de uma imagem, mas nos possibilita reconhecer os elementos necessários para uma boa comunicação.
            Um dos elementos básicos dos quadrinhos são os balões. Paulo Ramos diz o seguinte:

O balão (...) possui dois elementos: o continente (corpo e rabicho/apêndice) e o conteúdo (linguagem escrita ou imagem. O continente pode adquirir diversos formatos, cada um com uma carga semântica e expressiva diferente. A chave para entender os diversos sentidos está na linha que contorna o quadrinho (...) O efeito é obtido por meio de variações no contorno, que formam um código de sentido próprio na linguagem dos quadrinhos. As linhas tracejadas sugerem voz baixa ou sussurro. A forma de nuvem revela o pensamento ou imaginação da figura representada. O sentido dos traços em ziguezague varia conforme o contexto situacional. Podem indicar, por exemplo, voz alta, gritos, sons eletrônicos (2009. Pg 36).

Dessa forma, o balão torna-se um recurso comunicativo muito rico e que pode se apresentar de diversas maneiras, inclusive dando ao quadrinista a possibilidade de criar variações de balões para as mais diversas necessidades. Observem essa imagem do personagem Spawn:



Percebam que o Spawn é medonho, assustador. O rosto lembra uma caveira. O uniforme é agressivo e a postura parece colocar o personagem em cena. É teatral. Isso é importante para imaginarmos que tipo de voz ele pode ter. O balão nos ajuda bastante, pois possui um contorno grosso e escuro, isso nos passa uma impressão de voz densa e grave. Ele está dizendo: “Someone’s going to die for this!!” (Alguém irá morrer por isto!!). Percebam que “DIE” e “THIS” estão bem destacados. Então, quando lemos isso, juntando todas essas informações, imaginamos uma voz gutural, cavernosa. E ele está furioso e vai matar alguém por causa disso, sendo inclusive bem enfático no “die”. O texto nos dá uma indicação de intensidade nesse momento exato da fala. É importante perceber que muitos balões trazem certas palavras grifadas ou em negrito. Trata-se de uma pista para como devemos ler certas falas.

QUADRINHOS EM SALA DE AULA

            Como usar quadrinhos em sala de aula? Melhor: porque usar quadrinhos em sala de aula? Um fato é inegável: os quadrinhos estão nos livros das escolas, principalmente nos de gramática, redação e história. Não que não possa ser usado em outras disciplinas... Depende de como o professor se relaciona com os quadrinhos, mas vamos devagar...
            Waldomiro Vergueiro, no livro Quadrinhos na Educação, diz o seguinte:

A última virada do século (representou o coroamento de uma nova fase para as histórias em quadrinhos no Brasil (...) Por um lado, gradativamente elas passaram a ser entendidas pela sociedade não mais como leitura exclusiva das crianças, mas, sim, como uma forma de entretenimento e transmissão de saber que podia atingir diversos públicos e faixas etárias. Por outro, paulatinamente deixaram de ser vistas de forma pejorativa ou preconceituosa, inclusive nas áreas pedagógicas e acadêmicas (...) Tais publicações eram interpretadas como leitura de lazer e, por isso, superficiais e com conteúdo aquém do esperado para a realidade do aluno. Dois dos argumentos muito utilizados é que geravam “preguiça mental” nos estudantes e afastavam os alunos da chamada “boa leitura”. (2009. pg.9)

Muitas dessas críticas contra os quadrinhos se devem porque no início da década de 1950 o Dr. Fredric Wertham publica o livro “Sedução do Inocente”, baseado em sua tese associativa de que os quadrinhos estavam ligados a um grande número de crimes ou criminosos. Inicia-se “a caça às bruxas” pragmática durante todo o macarthismo, que lutava contra itens considerados subversivos na comunidade norte-americana. Essa política de fogueiras contra a leitura das crianças marca de sobremaneira todo o tratamento dado durante quase toda a segunda metade daquele século: a escola, a família, a igreja, o governo, todos condenam essas publicações com medo de que seus filhos tornem-se delinqüentes a partir da leitura. As conseqüências disso para a educação foram enormes e ainda são sentidas até hoje, quando muitos ainda não se desapegaram da imagem negativa que foi divulgada naquele período. (RAMA E VERGUEIRO, 2005, p.13).
Somente nas últimas décadas do século XX foi que, com o desenvolvimento das ciências da comunicação e dos estudos culturais, os veículos de comunicação de massa passaram a ser entendidos com suas próprias linguagens. Na Europa, passa-se a utilizá-las como parte do processo de aprendizado em História, por exemplo, e na China, Mao Tse-Tung utiliza-a de forma ideológica na educação de uma nova nação, com quadrinhos militares baseados em modelos de vida exemplares. (RAMA E VERGUEIRO, 2005, p.20).
Mas também há outra tese sobre o porquê dos quadrinhos já terem sido o principal culpado pela delinqüência infanto-juvenil: as HQs já foram o principal produto de consumo de massa para entretenimento desse público. Hoje, os pais, as Ligas das Senhoras Religiosas e as Associações dos Bons Modos ao redor do mundo culpam a TV e a Internet. Menos mal pra gente que curte quadrinhos. Em compensação, os quadrinhos resumiram-se a um público exponencialmente inferior ao que era nas décadas de 40 a 60 do século passado. O mercado encolheu, mas a arte dos quadrinhos concretizou-se em outros gêneros e, talvez, por isso mesmo, por esse redirecionamento do mercado, os quadrinhos puderam experienciar por outras áreas sem grandes preocupações.
O fato é que, da década de 1990 pra cá, de acordo com Rama e Vergueiro (2005, p.21), no Brasil, experiências sutis mostraram a boa aceitação dos quadrinhos em paradidáticos nos primeiros níveis de ensino. Aos poucos, várias disciplinas foram submetendo-se à tentativa e todas se revelaram positivas. Nos primeiros anos da década de 1990, as HQs tornam-se oficialmente reconhecidas pela LDB (Lei de Diretrizes e Bases) e pelos PCN’s (Parâmetros Curriculares Nacionais), que explicavam como os quadrinhos auxiliavam a educação, afinal, os estudantes querem ler os gibis; palavras e imagens ensinam de forma mais eficiente, incentivam o hábito da leitura, enriquecem o vocabulário, obrigam o leitor a pensar e imaginar.
            Vamos pensar um pouco sobre por que é fácil para um professor utilizar música ou filme em sala de aula? Porque os professores são familiarizados com o meio. Vocês, professores são educados para assistirem filmes e conseguem imaginar qual é o melhor para tratar de determinado assunto, mas vocês, de modo geral, não conhecem quadrinhos além da Mafalda, da Mônica, do Homem-Aranha e meia dúzia de outros super-heróis. Às vezes é difícil imaginar como utilizá-los. Eu sou professor de história e tenho algumas facilidades com isso, pois consigo fazer uma discussão histórica lendo “A Morte do Super-Homem”, por exemplo, um quadrinho banal, feito para engordar o cofre da editora, mas que pode ser lido como uma crítica ao estilo de vida norte-americano, porque isso é uma das coisas que podemos interpretar do símbolo que é o Super-Homem.
            A questão é: os professores que querem usar quadrinhos em sala de aula tem o hábito da sua leitura? Só poderemos utilizar quadrinhos na sala de aula se os professores lerem quadrinhos da mesma forma que lêem aos filmes e às músicas, porque tudo isso também são textos. Eu não tenho muitas dicas a dar para um professor de matemática, por exemplo. O professor de matemática tem de ler quadrinhos, conhecer a sua linguagem para daí extrair exercícios úteis dos quadrinhos em sala de aula. Mas vamos para algumas dicas no ensino de história. Vergueiro (2005, p.105) sugere:
O ensino de História em sala de aula pode ser facilitado com os recursos dos quadrinhos. Primeiramente, o alunado deve ser apresentado a noções de tempo utilizadas nas estórias, se acontecem no presente, passado ou em um futuro remoto. Deve ser trabalhada a relação temporal apresentada em cada quadro (ações representadas no desenho) e entre cada quadro.
Buscando analisar o conteúdo de cada estória, o professor pode encontrar temas locais e universais para abordar, pois os gibis apresentam temas variados, contam histórias de guerras, de acontecimentos importantes, de personagens marcantes, assim como apresentam estórias do cotidiano, das minorias, entre outras.
A análise historiográfica de um gibi conta muito sobre a História, a partir de dois focos principais: retrato do período temporal em que a estória se passa e o momento em que a HQ é feita. Em verdade, a maioria das HQs revela bem mais sobre o momento em que foram produzidos, toda a conjuntura e o contexto que levaram aquela história a ser contada daquela forma. Um ótimo exemplo disso é a coleção de revistas “Asterix”, que retrata bem o momento do expansionismo romano, mas que também sempre traz à tona a leitura de mundo contemporânea dos franceses (criadores do título) sobre todos os personagens de outros países que aparecem nas histórias, assim, os ingleses serão sempre frios e metódicos, por exemplo.
Posso citar aqui que existem uma grande variedade de quadrinhos baseados em momentos históricos: Gen – Pés Descalços (sobre Hiroshima e Nagasaki), Palestina – Na Faixa de Gaza, Pindorama – A outra história do Brasil, Maus (sobre judeus na 2ª Guerra), 300 de Esparta, Persepolis, várias publicações da editora Escala. Enfim, há uma grande variedade, inclusive de adaptações literárias que também são uma ótima fonte de análise histórica. A exemplo do Piauí, recentemente lançamos Foices e Facões – A Batalha do Jenipapo, de minha autoria, junto com meu irmão Caio Oliveira.
Também existem HQs biográficas, ou semi biográficas, fonte inquestionável de conhecimento histórico. Analogias como as encontradas em “X-Men”, onde mutantes com poderes geneticamente evoluídos são vítimas de fortes preconceitos, nasceram da real discriminação que várias minorias norte-americanas sentiam na década de 1960.
O professor de história, numa ação interdisciplinar, unindo esforços com professores de redação e arte-educação, ainda pode solicitar de seus alunos que eles produzam sua própria história em quadrinhos sobre um fato do conteúdo trabalhado na sala de aula. O processo de criação desse gibi será muito produtivo e os alunos aprenderão bastante sobre o assunto abordado.
Não quero aqui fazer uma longa exposição de exercícios em sala de aula. Imagino que vocês entendam o quão importante os quadrinhos são e aprendam a conhecê-los e a utilizá-los em sala de aula. Agora se vocês não sabem o quanto eles são importantes informem-se compreendendo o seguinte: são obras de arte. Não vá questionar os valores das artes e tentar descobrir se uma é menor que a outra. No mundo “pós-moderno” isso é impossível. Entenda que quadrinhos são arte e que muita gente gosta de lê-los por que são mais acessíveis e mais rápidos de compreender, na maioria das vezes. Mas se você não conhece bem quadrinhos e hoje imagina que se tratam apenas de super-heróis e turma da Mônica, nós temos um problema. Vá ler!

QUADRINHOS COMO OBJETO DE PESQUISA

A Escola dos Annales, ou Nova História, surgiu no final da década de 1920, na França, e durante várias gerações de estudiosos, como Marc Bloch, Lucien Febvre e George Duby, trouxe à academia a possibilidade de um estudo científico em um terreno virgem, pouco ou desconsiderado anteriormente pela história positivista ou marxista: tratava-se do campo sócio-cultural. A construção histórica, que antes era feita baseada em uma concepção política e econômica, tinha agora um vasto leque de caminhos para percorrer sobre assuntos e abordagens novas ou não. Foi partindo desta concepção que autores como Carlo Ginzburg, no livro O Queijo e os Vermes, puderam expor sua visão renovadora sobre a História.
No livro de Ginzburg encontra-se não apenas a valorização das minorias como sujeitos históricos, mas a representação do mundo e do seu tempo através do pensamento e da experiência de um único homem. Paralelo a isto se tem a participação da história das mentalidades. O Queijo e os Vermes trata da vida de um moleiro que se chocou contra a Igreja Católica medieval devido a suas teses sobre a vida, o mundo e Deus. Dessa forma, Ginzburg mostrava que a classe nobre ou clerical não era a única detentora do conhecimento e da verdade, colocando em cheque o tradicional ensino da história.
Minha trabalho de conclusão de curso, Os Quadrinhos pós-68, parte de uma concepção semelhante, que apenas a Nova História poderia ter aberto o caminho. É bem verdade que devido às concepções da escola novista, as histórias em quadrinhos ganharam um pouco de notoriedade naqueles mais abrangentes e completos livros da historiografia ou imprensa moderna, devido à crescente utilização da história material e cultural, mas a participação desta arte, historicamente falando, ainda está longe de ser a merecida. As histórias em quadrinhos são tão ignoradas que até mesmo em volumosos livros sobre História da Arte nada mais que alguns parágrafos são dedicados ao movimento Pop-Art, que teria sido influenciado pelos comics norte-americanos, apenas isso.
Poderia colocar que o elemento que norteou meu TCC foi apenas a tentativa de reformular o conhecimento existente, apregoando a importância histórica dos quadrinhos, mas busquei algo além disso. Construí-o a partir da necessidade de mostrar as HQs como parte de uma história iconográfica amplamente desconhecida do ponto de vista artístico e histórico. Utilizei desta produção cultural como fonte de pesquisa, para a compreensão de uma sociedade ou de indivíduos que nela viveram. Entendi o quadrinho como importante fonte na construção de um quadro histórico, mais especificamente o quadro político-cultural da geração pós-68.
Na verdade, o eixo do meu trabalho foi compreender o universo político e cultural que vivenciaram os quadrinistas da geração pós-68. Foi estudar, analisar e, a partir daí, construir o quadro social do momento.
A escolha do ano de 1968 explica-se devido representar, não apenas no Brasil, mas também em vários outros locais do mundo, como França e Alemanha, um período de intensa busca de novas referências político-ideológicas. Representa um fenômeno histórico que se construía há décadas e de vastas proporções, que buscava mudanças sociais bastante significativas. É com base no espírito deste momento tão fortemente característico, do qual culminou tamanhas manifestações, que me debrucei sobre para saber como ele influenciou sua nova geração, ou seja, saber qual a herança de “68”, passando desde as tumultuadas manifestações políticas até sobre seus desdobramentos, nos planos dos costumes e da cultura.
Tinha como pretensão estudar o universo cultural dessa geração, ou seja, o estudo dos movimentos que nortearam a vida de tantos no período, como a contracultura, o Tropicalismo, a jovem guarda, entre outros, e suas reverberações em diversos tipos de arte, sejam literárias, plásticas ou cinematográficas, por que é extremamente importante esta compreensão do contexto artístico.
Mas eu precisava de um recorte específico. Meu objeto de pesquisa não poderia ser todo e qualquer tipo de quadrinhos produzidos nesse período. Escolhi três pessoas quadrinistas: Amauri Pamplona, Arnaldo Albuquerque e Antonio Amaral. São artistas que produziram muito, principalmente Amauri, autor 87 revistas intituladas O Grelo, 12 livros de cartuns e de Hai Kais. Em seu material, por a enorme maioria ser inédita até hoje, encontra-se muita informação sem medo de censura ou represálias sobre o período de ditadura militar brasileira. Arnaldo publicou no ano de 1977, ainda em um regime ditatorial, a revista Humor Sangrento, que é a primeira publicação do gênero no Piauí. E Amaral, artista plástico, reconhecido internacionalmente por sua revista Hipocampo.
Amauri Gonçalves Pamplona Machado nasceu em 1942, é carioca, filho de mãe piauiense, residente em Teresina desde 1984. Viveu a década de 1960 com maturidade suficiente para entender o que aconteceu em 1964 e 1968. Reflexos dessas datas são percebidos em sua produção já em 1967, em suas poesias, ou em 1969, com a história em quadrinho (hq) Batalhas de Machões, além dos mais de oitenta títulos do O Grelo, na década seguinte.
Arnaldo Albuquerque, nascido em 1952, era muito jovem durante 1964/1968, mas amadureceu na década de 1970 revelando um talento nato para retratar o Brasil, mais particularmente o Piauí, em um período tão marcante. Engajou-se culturalmente e produziu quadrinhos (Humor Sangrento), shows (Piau e Udigrudi, que contou com a primeira participação de Maria da Inglaterra e Lena Rios), filmes (Adão e Eva do Paraíso ao Consumo, Terror na Vermelha - junto com Torquato Neto), animação (Carcará Pega Mata e Come), jornais (mimeografado Gramma, A Hora Fa-Tal), telas, ilustrações...
Antonio de Pádua Amaral, nasceu em 1962, ainda era criança na década de 1960, cresceu nos anos 1970 e na década de 1980 começou a produzir material de qualidade, como ilustrações para o mimeografado O Osso, que fazia críticas políticas e sociais no final da ditadura militar. Mais tarde, em 1994, lançaria a Hipocampo, importante título na história das histórias em quadrinhos do Brasil ou mesmo no mundo.
Uma curiosidade que acabou se revelando fundamental para a realização do meu TCC foi  a diferença de uma década de vida entre o Amauri e Arnaldo e entre Arnaldo e Amaral, o que deu a todos perspectivas e manifestações diferentes durante o período de chumbo brasileiro. Enquanto Amauri vê e vive o golpe militar e o ano de 1968 com bastante intensidade, Arnaldo concretiza-se como artista no auge da ditadura e Amaral representa melhor o momento de abertura política, sentindo mais as conseqüências da ditadura.
Como pode ser percebido, meu trabalho não se limitou apenas a analisar as obras destes artistas, como também estudar seus próprios autores, suas vidas, utilizando-os como objeto de estudo, como fonte de pesquisa para entender a sociedade da época. O estudo do autor e obra, melhor dizendo, do quadrinista, permitiu um maior aprofundamento do período e o trabalho ganhou um aspecto um tanto biográfico, buscando o entendimento e compreensão de um recorte temporal a partir da vida de determinadas pessoas.
A historiografia já provou que isso é possível, partindo do entendimento de que uma pessoa é fruto de seu tempo e que isto também é reciprocamente verdade. Entretanto, enfatiza-se o fato de não se tratar de uma biografia comum. O que se fez foi um retrato interligado entre as pessoas e a sociedade onde viveram; um recorte temporal que uniu indivíduo ao grupo; deixar claro qual a ligação entre iniciativa pessoal com necessidade local3, ou seja, quais as condições político-culturais em voga que levaram os artistas a produzirem sua arte.
Para compreender a conjuntura político-cultural [de determinado momento], seria preciso articulá-la com as trajetórias pessoais. Micro e macroestrutura condicionando um processo de elaboração ética coletiva e individual, combinada a uma prática política. Um programa revolucionário que emerge como manifestação de uma identidade construída para além da dimensão política.

Daniel Aarão Reis adverte sobre a construção de uma história político-cultural, sobre a necessidade da abordagem pessoal para a elaboração do conhecimento. Em Os Quadrinhos pós-68 pode-se encontrar como os quadrinhistas de qualquer canto do país, em qualquer momento histórico, podem contribuir para o Brasil tanto para a arte popular quanto para a sua História.
Georges Duby afirma que é necessária uma história mais carnal, do homem comum na sociedade, uma história mais “útil que a concepção superficialmente centrada nos indivíduos excepcionais”. Ele acredita que mais do que causa e efeito criando a história, há correlação e interferência direta do homem, que gera a história. Cada homem é um fator indissociável e coeso numa concepção mais ampla para que se compreenda o funcionamento do sistema, da História5. O estudo histórico sobre o prisma dos quadrinhos busca esta visão. Duby também é um ferrenho defensor do entrosamento e paixão do pesquisador com suas fontes e objetos de pesquisas, principalmente por temas ricos e virgens, e acima de tudo, sempre cercado de cautela, busca a “alquimia” que traga à tona uma história além da ilusão de uma objetividade total no ofício do historiador.
Os Quadrinhos Pós-68 é um trabalho onde “paixão” e “alquimia” foram fundamentais para sua conclusão. A cada nova informação, a cada nova história em quadrinhos encontrada, a cada peça que se encaixava, a informação surgia, e trata-se de uma informação tão nova, tão inexplorada, que muitas vezes foi uma tarefa árdua impedir que se expandisse além do necessário para sua conclusão.
REFERÊNCIAS


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McCLOUD, Scott. Desvendando os quadrinhos. São Paulo: M. Books, 2005.
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COLETÂNEA. Versões e Ficções: O Seqüestro da História. 2ª ed. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 1999. p. 44
DUBY. Georges. Trad. MARQUES. Clovis. A História Continua. Ed. UFRJ: Rio de Janeiro. 1993. pg. 13.