quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Estrada para Perdição: preferências entre diferenças

Iniciado 18/08/2014 e concluído em 20/08/2014.

Obs: Este texto contém informações que podem prejudicar a leitura tanto do filme, quanto do quadrinho aqui citados. Ou seja: tá cheio de spoilers.

Introdução

Acabei de ler o quadrinho Estrada para Perdição, escrito por Max Allan Collins e desenhado por Richard Piers Rayner. Há dois dias atrás revi, depois de vários anos, o filme homônimo dirigido por Sam Mendes. Essa agradável pesquisa só foi realizada por causa do convite do amigo Aristides Oliveira para que eu participasse de um encontro sobre cinema, literatura, quadrinhos e história. A ideia era que eu sugerisse um filme inspirado ou baseado em quadrinhos, que seria exibido durante a programação do evento, e depois pudesse traçar alguns comentários acerca do original e sua adaptação. Qual filme eu deveria escolher? Pensei durante uns três minutos e decidi que deveria ser um filme que poucos tivessem conhecimento de sua ligação com os quadrinhos Não queria nada óbvio como Batman ou Homem-Aranha. Algumas opções como American Splendor e Terror na Antártida passaram pela minha cabeça. Me decidi por Estrada para Perdição, pela boa repercussão entre a crítica que o filme teve, estrelado por gente como Paul Newman, Tom Hanks, Jude Law e Daniel Craig.



Enquanto escrevo estas linhas, penso: qual versão eu gostei mais? O quadrinho de Estrada para Perdição ou o filme? Na maioria das vezes fujo desse tipo de pergunta, sempre levantando a hipótese de que se tratam de linguagens muito diferentes, logo não dá para compará-las. A cada dia que passa, penso que esse tipo de escanteio é uma forma de não tratar nossas preferências pessoas com mais juízo e critério. É evidente que são coisas diferentes: um é quadrinho e o outro é cinema. Por isso, gosto deles de maneiras diferentes, mas também com intensidades diferentes. Entretanto, se eu parar para avaliar as diferenças narrativas entre as versões poderei julgar qual das obras me agrada mais, afinal, elas surgem no contraponto das semelhanças, e nesse questão, as duas obras tem bastante coisas em comum: obviamente, elas contam, a princípio, a mesma história do assassino da máfia escocesa Michael Sullivan tentando vingar a morte de sua família, enquanto dirige pelas estradas de Nova Iorque da depressão pós-29, acompanhado do seu filho. Considerando apenas isso, podemos julgar, usando critérios rigorosos, temperadas por doses reguladas de preferências pessoais, quem conta melhor essa história. Outra semelhança que permite o comparativo vai além da obra e recorta-se nos limites da forma: ambas são narrativas. Uma boa tela a óleo possui narrativa. Cinema e quadrinhos, assim como a literatura ou teatro possuem um “contar sobre” que coloca essas artes todas construídas sobre a base das narrativas. A leitura narrativa dessas artes são ligeiramente semelhantes, o verbal, o imagético e o temporal, seja durante uma projeção, encenação ou leitura, estabelecem um processo narrativo. Toda arte é narrativa. Se não narrar algo, não merece ser chamada de arte.

Em sendo Estrada para Perdição, quadrinho e filme, ambos, ótimas narrativas sobre o mesmo tema, é possível decidir criticamente qual deles é o melhor em suas versões. Percebam que não estou escolhendo uma arte em detrimento da outra. Não se trata de dizer qual arte é mais importante, mais eficaz ou melhor. Esse tipo de discussão é infantil e não leva a lugar nenhum. A ideia é julgar as diferenças, mas não as linguísticas e suas limitações, e sim as diferenças no âmbito do drama narrativo envolvendo a história contada: a adaptação cinematográfica, por vir depois, escolhe e constrói essas diferenças. Por que isso é feito? Com quais intenções? São mudanças que melhoram a narrativa original ou a empobrecem? Enfim, as diferenças nos permite decidir qual versão nos agrada mais, mesmo que o julgamento seja feito baseado em critérios pessoais, ele deve ser feito com clareza, responsabilidade e respeito por ambas as obras.



Comparando a diferença com o original

Para efeito de melhor compreensão, vamos chamar o assassino da máfia de Sullivan e seu filho de Michael, já que eles possuem o mesmo primeiro nome. Pois bem, tanto no quadrinho como o filme, Michael é o narrador da história. É ele quem conta a história do pai. Acontece que no quadrinho a presença do narrador é muito mais forte, eventualmente aparecendo enquanto escreve suas memórias. No filme, a narrativa de Michael aparece, salvo engano, em apenas dois momentos: no começo e no fim. O filme conta a história através da narrativa das imagens utilizando menos a presença do narrador. Isso me agrada mais. O narrador sempre foi, para mim, uma figura indecisa, que não sabe até onde vai seu conhecimento, mesmo quando é onisciente. Não me agrada muito a presença do narrador em artes como quadrinhos e cinema, frutos de uma narrativa muito mais imagética do que textual. Assim como também não me agrada os balões ou voz em off representando pensamentos. Mas eu disse que tentaria não explorar os limites linguísticos, então, o que importa é que o filme parece mais interessante quando explora menos o Michael narrador.



O começo do quadrinho preocupa-se em apresentar os personagens, a cidade, a depressão, a corrupção, o tráfico, de forma bem rápida e na nona página já somos levados ao ponto de virada da história, quando Michael, curioso, entra no carro do pai para tentar descobrir o que ele faz para ganhar a vida. O filme tem uma certa delicadeza em apresentar esses elementos. O Sr. Looney, patrão de Sullivan, é introduzido no filme de forma muito especial, tratando Michael e seu irmão como se fossem netos e o próprio Sullivan como se fosse um filho. Aliás, a representação de Looney no filme é o ponto mais destoante em comparação à versão original. No filme, mesmo sendo um chefão do crime, ele é sereno, melancólico e até mesmo doce, a figura de um avô divertido, enquanto no quadrinho ele é nervoso, que não evita gritar quando necessário e representa um poder opressor.



Já que estamos falando de Looney, cabe aqui dizer que no filme ele não toma parte no assassinato da família de Sullivan. É tudo trama do seu filho, Connor. Isso também é uma diferença gigantesca entre as versões. No filme, Looney ama Sullivan como a um filho (o que fica evidente na cena em que tocam piano juntos). No quadrinhos, Sullivan é apenas o Anjo da Morte, um bom assassino que precisava ser apagado: queima de arquivo. No filme, Looney agride Connor por ter atacado a família de Sullivan. No quadrinho, Looney é quem entrega a Sullivan o envelope que traz a ordem escondida para que o próprio seja assassinado. Quem entrega o envelope, no filme, é Connor, deixando subentendido que o real motivo para a tentativa de assassinato de Sullivan é a inveja que Connor sente dele por conta da relação fraternal que existe entre Looney e Sullivan.



Tudo isso é muito diferente entre o filme e o quadrinho, por conta disso o desenrolar da história tem perspectivas divergentes. No filme, Sullivan sabe que Looney não deu a ordem de morte. Existe um respeito entre os dois, por isso, é muito emocionante a cena da chuva, quando Sullivan descarrega todos os tiros de uma thompson sobre Looney e seus capangas. Antes de morrer, Looney diz algo mais ou menos assim para Sullivan: “Que bom que foi você.” No quadrinho, Looney foge para o México e para Sullivan conseguir atingi-lo precisa revelar o esconderijo do mafioso para a polícia, que vai ao seu encalço. Looney não morre no quadrinho, é apenas preso por um policial em serviço. Na ocasião ele diz: “Por que ele não veio pessoalmente? Eu seu que quer me matar...”. O Policial responde: “Ele me disse que quer que você sofra... Que sobreviva sabendo que seu filho morreu violentamente”. No quadrinho, você não sente nenhuma simpatia por Looney e pode até ficar satisfeito com a vingança elaborada por Sullivan. No filme, você sente a perda, tanto de Sullivan quanto do próprio Looney. É uma tragédia shakespeariana. Tom Hanks sofre ao disparar a thompson. Prefiro a forma como foi adaptada no cinema.

               Filho esperando o pai, depois que ele mata algumas dezenas de pessoas.

A relação entre Michael e Sullivan é fundamental para a história. Durante o tempo em que eles passam na estrada, o sentimento de pai e filho é construído mais fortemente, como se a tragédia os tivesse aproximado. Isso é bem construído e é essencialmente semelhante tanto no quadrinho quanto no filme. Entretanto, há uma diferença significativa. No filme, Michael não quer segurar uma arma, nem como auto defesa, quando seu pai a oferece pela primeira vez. No quadrinho (2002, vol 1, p. 69), quando Sullivan diz que os assassinos de sua mulher e filho podem voltar, Michael pede: “Então me dê uma arma! A gente espera esses canalhas! Aqui é o nosso lar!”. Antes disso, quando Michael descobre o que o pai faz, Sullivan diz que é um soldado de Looney, como que tentando justificar seus crimes. Michael diz que não quer ser soldado, Sullivan responde: “ótimo!” (2002, vol 1, p. 36).  Sullivan não quer que o filho torne-se um assassino. No filme, Michael recusa naturalmente a arma, enquanto que no quadrinho ele quer uma. É uma diferença sensível no personagem. Acontece que no filme, Michael não mata ninguém e no quadrinho ele tira a vida de dois capangas, em cenas diferentes. A primeira morte pelas mãos de Michael acontece na metade do segundo volume, ou seja, no meio da história. Na minha opinião isso diminui uma trama que é a de que, mesmo Michael sendo filho de Sullivan, ele poderia ter uma vida diferente da do pai, não se tornando um assassino.



       Tanto no filme quanto no quadrinho o objetivo de não macular a alma de Michael com o assassínio é bem trabalhada. Na cena em que Michael mata o primeiro (2002, vol. 2, p. 77 a 79), Sullivan diz: “Perdoe-me Annie”, pedindo desculpas à mulher por ter condenado o próprio filho nessa estrada, que é, literalmente, da perdição. Michael se arrepende e diz que não quer ir pro inferno, pois a bíblia diz “não matarás”. No filme, em cena de diálogo, Looney diz que todos os envolvidos naquele história irão para o inferno, ao que Sullivan responde algo parecido com isso: “Michael não. Ele pode se salvar”. No quadrinho, uma criança é condenada ao assassinato. No filme, não. De certa forma, no quadrinho seria mais interessante se não descobríssemos que Michael se arrepende e torna-se um padre ao final de toda a história. Talvez ele tenha sido absolvido. Um final feliz. Entretanto, prefiro o modo do filme, que leva a tensão sobre a alma do garoto até, praticamente, a última cena, quando Michael não consegue matar o assassino do próprio pai. No filme, antes de morrer, Sullivan atira em Maguire (Jude Law) pelas costas e morre feliz, em redenção porque conseguiu salvar o filho, evitando que ele torne-se como o próprio pai. Também, um final feliz.

Conclusão

Acredito que os pontos divergentes trabalhados até aqui são os essenciais, os que tornam, de fato, as narrativas diferentes no âmago de suas estórias. Entretanto, existem vários detalhes que tornam o filme diferente do quadrinho, como, por exemplo, Maguire, o assassino contratado para caçar Sullivan. No quadrinho ele sequer tem nome e só aparece nas últimas páginas. No filme, ele é um personagem fascinante que cria uma tensão de caça ao rato e, provavelmente, é autor da melhor cena de diálogo do longa-metragem (quando ele encontra com Sullivan em um trailer no meio do nada).

Jude Law

Nesses pontos essenciais, considero as diferenças melhores que no original, mas o quadrinho vantagens que reconheço, mas não prefiro. É evidente que o quadrinho tem mais cenas de ação, de bang bang! O filme parece mais frio, o quadrinho é quente! Existe uma cena fantástica apenas no quadrinho, quando Sullivan assalta e incendeia o barco Quinlan (aliás, esse é um fato histórico. Quinlan realmente existiu e pegou fogo) para convencer a máfia de Chicago a entregarem Connor. No filme, na cena em que Sullivan vai falar com Nitti, o braço direito de Al Capone, sobre toda essa situação, as coisas são resolvidas numa conversa. No quadrinho, Sullivan mata dezenas de capangas para fugir do prédio, descendo o corrimão e disparando pra todo lado. No filme, a mulher e filho de Sullivan não aparecem mortos. Sam Mendes prefere não mostrar os corpos, apenas o rosto triste de Tom Hanks foi suficiente para sugerir. No quadrinho, os corpos são apresentados ensanguentados e numa longa cena de luto e despedida. Às vezes, a sugestão, ao invés de uma cena mórbida, pode ser muito melhor (eu acho!) No quadrinho, Al Capone é um personagem recorrente, no filme é apenas a sugestão de uma sombra poderosa.
Colocando tudo na balança e, usando como contrapeso as preferências pessoais, preciso dizer que o filme me agrada mais na forma sutil como tudo é narrado. Entretanto, o quadrinho é uma grande obra, com desenhos fabulosos e uma incrível mensagem. Elas são diferentes. Exatamente por isso, preciso escolher qual me agrada mais.

Preciso dizer ainda que essa avaliação parece uma exceção à regra. Penso em adaptações como Scott Pilgrim, Watchmen, Akira, 300 de Esparta, Sin City e todos os originais são claramente melhores quando faço uma rápida análise. Normalmente, o original é sempre melhor. E pra você? Qual adaptação é melhor que o original?

sábado, 16 de agosto de 2014

Marvel vs DC no cinema


Se eu paro para pensar qual o filme mais antigo e significativo da DC para o cinema logo lembro de Superman, de 1978. Um grande e eterno clássico, com direito ao kryptoniano salvando até mesmo gatinho preso numa árvore. Uma rápida busca no wikipedia me diz que nos anos 40 e 50 houve outros filmes do Super e do Batman.



Depois disso, somente no final de 70 nós tivemos o Super e suas continuações posteriores. Monstro do Pântano, em 1982, que, por incrível que pareça, teve um herdeiro chamado o “Retorno do Mostro do Pântano” em 1989, mesmo ano do primeiro filme do Batman, de Tim Burton (também um grande clássico).



De lá pra cá a DC acumulou fracassos como Aço (Steel), Mulher-Gato, Lanterna Verde e Jonah Hex, além do duvidoso Superman Returns (há quem goste). Fugindo dos super heróis, podemos considerar Constantine, V de Vingança, Liga Extraordinária, Stardust, Os Perdedores e RED. Não podemos esquecer Watchmen.
Entre altos e baixos, a DC manteve-se presente nas telonas com grandes produções e, mesmo filmes sofríveis (como os Batman de Joel Schumacher) vendiam ingressos ou bonequinhos suficientes para incentivarem a produção do próximo.

Se eu paro para pensar no filme mais antigo e de sucesso significativo da Marvel, o primeiro que me vem à cabeça é X-Men. Aí eu faço à mesma coisa e vou ao Wikipedia: descubro que em 1944 teve um filme do Capitão América. Depois disso tiveram alguns filmes feitos para TV do Hulk, Dr. Estranho e Capitão, mas não estamos considerando eles, ok? Apenas aqueles que vão para o cinema! 

Capitão em 1944

Ou seja, há um grande penhasco desde o filme do Capitão de 1944 que é atravessado apenas em 1986, com Howard – the duck (aquele pato que aparece no fim de Guardiões da Galaxia e que todos nós vimos muito na sessão da tarde). 


Depois, nós tivemos um Justiceiro (1989), Capitão América (1990) e um Quarteto Fantástico (1994) escondido de tão ruim que era. Esses dois últimos filmes foram grandes fracassos, e as coisas na Marvel só começam a mudar com o sucesso de Blade (1998), que abriu os olhos da Fox: interessados por quadrinhos lançam o filme X-Men (2000), aplaudido pela crítica e sucesso de público. 




De 2000 pra cá aconteceu o que nós conhecemos melhor: mais filmes do Blade, Homem-Aranha e suas continuações, outros X-Men, dois filmes do Justiceiro, Wolverines, Motoqueiro Fantasma, Demolidor, Elektra e até um filme do Homem-Coisa (Man Thing, de 2005) que eu nem sabia que existia: deve ser ruim como os dois do Mostro do Pântano...



De maneira geral, entre altos e baixos, as adaptações de filmes baseados nos personagens da Marvel continuavam com um espectro parecido com os da DC. Filmes que queriam agradar mais aos produtores que aos fãs. Vejam, por exemplo, no filme do Wolverine, o que eles fizeram com o Deadpool! Pensem no Homem-Aranha 3! Ou no Quarteto Fantástico 2. Ou tentem entender porque fazer um filme do Aço quando a DC tem tantas opções que significam alguma coisa! Vejam ainda, um vídeo do Kevin Smith no youtube (aqui) explicando como sofreu para escrever um roteiro do Superman para Hollywood! 



As coisas só mudam, realmente, quando a Marvel é comprada pela Disney e sua subsidiária (Marvel Studios) começa a recuperar os direitos dos personagens que estão espalhados por aí e a fazer seus próprios filmes: O primeiro é Homem de Ferro (2008). O sucesso é estrondoso, todos amam Downey Jr. e sua interpretação de Tony Stark e todos gostam mais ainda de ver os pós-créditos, onde apareceu o Sr. Nick Fury, significando um possível filme dos Vingadores com aqueles atores...



A Marvel construiu seu universo no cinema. Isso é sem precedentes na história de Hollywood. Parece uma looonga história envolvendo todos os personagens nos filmes que vem em seguida: Capitão América, Hulk, mais Homem de Ferro, Vingadores, mais Capitão... E a Marvel sofre porque não pode usar seu Homem-Aranha, que está nas mãos da Sony (fazendo um reboot muito mediano) nem seus X-Men (Fox). Um universo coeso onde até mesmo personagens restolhos como os Guardiões da Galáxia tornam-se fenômeno mundial, interligado nas conexões Marvel.

Acho que aqui fica claro minha posição: a Marvel Studios pensa como editora e tem na Sony e na Fox concorrentes que só atrapalham seu sucesso ainda maior. E quando pensam como editora, unem seus fãs criando neles o hábito de comprarem filmes como partes de um longo seriado visto na telona, em torno de um universo coeso (Obs: no começo da história do cinema era comum filmes seriados nas telonas, o próprio Super do George Reeves teve vários na década de 50, mas eles não criavam um universo interligado).

A Marvel foi comprada pela Disney, nem por isso ela interfere diretamente nos filmes daquela empresa. A Disney sabe que é a Marvel quem entende de quadrinhos e a Marvel, autônoma, se junta com quem entende de cinema. A DC, filhote da Warner, não tem autonomia e não consegue fazer seus próprios filmes. Man of Steel é um sucesso duvidoso. Os Batman de Nolan, com exceção do Coringa de Heath Ledger, também é duvidoso e não faz parte do universo de Man of Steel. Enquanto Marvel engrena um sucesso atrás do outro, fazendo filmes sobre um roedor de metranca no espaço, a DC não consegue pensar seu universo coeso com seus grandes medalhões: Super, Bat e Mulher Maravilha.

HQ de Caio Oliveira. Confira mais aqui.


A Marvel é assim. Ano que vem a gente tem Vingadores 2, mas teremos também um grande sucesso (pode esperar) chamado: Homem-formiga, enquanto a Warner ficou um tempão decidindo quem interpretaria o Aquaman: Momoa ou The Rock?

Homem Formiga procurando a DC/Warner.

sábado, 9 de agosto de 2014

Você prefere Marvels ou Reino do Amanhã?


A década de 1990 é famosa por conta dos seus quadrinhos ruins. Toda uma geração que foi criada por desenhistas como Rob Liefeld e seus genéricos, sagas intermináveis e estragadas (como os clones do Aranha) e capas metalizadas pra vender mais X-men sem conteúdo. Entretanto, é uma década que nos proporcionou duas obras divisoras de águas na história dos quadrinhos de super-heróis: Marvels e Reino do Amanhã.

As duas obras foram desenhadas por Alex Ross, que imortalizou seu nome na indústria depois disso. Marvels foi feito em parceria com Kurt Busiek e Reino do Amanhã com Mark Waid. A primeira conta o passado do universo Marvel, a segunda é sobre o futuro do universo DC. Durante muito tempo me perguntei qual das duas era a melhor e percebi que, para além de estereótipos do tipo “marvete” ou “decenauta”, definir isso envolvia outras sensibilidades.

Marvels é de 1994 e Reino do Amanhã foi lançada dois anos depois. Um olhar cuidadoso percebe que Alex Ross melhorou significativamente sua técnica de pintura. A arte parece mais bem feita. Reino do Amanhã também possui cenas mais impactantes, com lutas épicas, além de um clímax de tirar o fôlego. Talvez seja uma das melhores histórias de super-herói de todos os tempos com um tema muito relevante: os velhos mitos ensinando como continuar sendo “heróis” à nova e despreparada geração. Uma história sobre aprender com os velhos.

Marvels, por ser uma minissérie que se passa em 4 tempos diferentes do universo Marvel, possui sua continuidade cronológica, mas não tem um “crescendo” que culmine em um grande momento, como acontece no exemplo da editora DC. Diferente de Reino do Amanhã, que tem nos míticos Superman, Batman, Mulher Maravilha e Shazam os protagonistas, Marvels conta a história sob a perspectiva dos humanos normais, de um repórter fotográfico chamado Phill Sheldon, que registra a passagem das “maravilhas” pela Terra, desde o Tocha Humano e Namor dos anos 40 até o Homem-Aranha dos anos 70, passando pela paranoia anti mutante do final dos anos 60. Trata-se de um registro histórico que os senhores Alex e Kurt observaram cuidadosamente, vasculhando os detalhes do universo Marvel, tendo as publicações da época como verdadeiros documentos-fonte.

Decidir se você gosta mais de Reino do Amanhã ou de Marvels é dar preferência a um de dois gêneros diferentes. O gênero de ambos esses quadrinhos não é exatamente “super-herói”. Reino do Amanhã tem seus heróis mitológicos e suas grandes lições e maneira épica de ver a vida. Marvels é uma história humana numa maneira moderna e cotidiana de ver a vida, por mais incrível que ela possa parecer.

De certa forma, essas obras significam ou representam bem a linha editorial de onde foram criadas. Marvel e DC. Mais humano, mais mítico.

Então, que tipo de narrativa você prefere: o épico aventureiro fantástico ou moderno cotidiano histórico?

quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Diferença entre novos leitores “nerds” e “otakus”

(Desculpe... eu não consigo)

Depois de quatro anos trabalhando em minha livraria especializada em quadrinhos (Quinta Capa), pude perceber algumas diferenças de comportamento entre o público leitor de comics e de mangás. Claro que irei tratar aqui de generalizações e, talvez, eu esteja correto em fazê-las, talvez não...

Primeiro é importante salientar que os mangás, desde 2000, quando Dragon Ball começou a ser lançado pela editora Conrad, se formou um novo público consumidor. Eu mesmo lia muitos comics na época e me tornei, também, leitor de mangás. Entretanto, surgiu aquele público novo, que veio com o sucesso que a série de Goku & Cia fazia na TV, e que não lia quadrinhos antes. De 2000 pra cá surgiu um grande novo público, com uma infinidade de novos títulos orientais nas bancas. Contudo, do ano 2000 pra cá já distam 14 anos, uma nova geração nasceu e, com ela, abriu-se um fosso quase intransponível entre leitores de mangás e leitores de “quadrinhos” (quando os otakus dizem que mangá é mangá e comic é quadrinho, não tem quem consiga convencê-los de que mangá também é quadrinhos...). Criou-se um ódio étnico baseado em subjetividades e preferências. Existem tribos que não se misturam: leitores de comics que odeiam mangás e leitores de mangás que odeiam comics. E existe o grupo dos inteligentes, que procuram quadrinhos bons, independente do estilo.

É do meio desse grupo inteligente que emergem alguns clientes aqui na livraria. Alguns se desfazem de coleções inteiras de mangás descartáveis pelos quais passaram a infância lendo e endeusando seus autores, achando-os o máximo! Eles se desfazem de suas coleções e procuram coisas novas nos comics. Da mesma forma, aparecem leitores de comics procurando algo diferente nos mangás. Mas existe um tipo de gente, no meio desse grupo inteligente, que ainda se destaca: são aqueles que procuram os clássicos.

É aqui onde otakus e nerds se diferenciam mais. Os novos nerds, aqueles que emergem do mundo do mangá e procuram comics, muito espontaneamente, querem conhecer os clássicos dos super-heróis. Definitivamente, não é raro ver um “nerdófito” procurando Watchmen ou Batman – Cavaleiro das Trevas. Já os novos leitores de mangás, ou essa geração que surgiu de 2000 pra cá, não se importam em procurar os clássicos dos mangás.

É apenas uma reflexão que percebi aqui no meio desse cotidiano. Talvez o problema seja que nosso mercado não tenha tantas obras “clássicas” de mangás disponíveis, mas a impressão que dá é a de que otakus só se interessam pelo que está na crista da onda, com raras exceções, como Yu Yu Hakushô e Berserk (que, até onde entendo, são mangás relativamente antigos, mas eu não os chamaria de “clássicos”). Na prateleira da Quinta Capa, Nausecäa criava teia de aranha. Gen e Buda também. Lobo Solitário? Ninguém conhece! Akira tem um desenho muito estranho, eles dizem! Quem é Masamune Shirow? Entendeu? E ficam nessa, lendo apenas Bleach e os sucessos da semana...

Motoqueiro Fantasma: Estrada para a Danação


A coisa toda começa ruim pelo título. Um trocadilho infeliz com “Estrada para a Perdição”, quadrinho que foi adaptado para cinema em um longa com Tom Hanks, tão bom que não merecia essa “homenagem” (imagino que a ideia infeliz foi de algum tradutor da Panini ou Salvat, que deve ter achado genial). Neste quadrinho sobre um Motoqueiro Fantasma tentando fugir do inferno, onde é eternamente caçado por uma horda destruidora, que, diariamente, trucida seu corpo fumegante, parece que Garth Ennis (Preacher) está na pior fase de sua carreira.
É uma história boba, que se esforça em chocar com cenas fortes de corpos sendo mutilados e explodidos. Não se trada da mutilação em si ser ruim, o problema é ela ser completamente desnecessária, não acrescentar nada na “trama” da história, como, por exemplo, em toda a sequência onde aparecem membros da Klu Klux Klan sendo explodidos. E até mesmo quando vemos um anjo e um demônio lutando e usando o corpo de dois soldados como armas (que poderia ser bem legal) é completamente estragada pela arte ruim de Clayton Crain. Aqui eu abro um parêntese para dizer que Crain pode até ser um bom ilustrador ou capista, mas acredito que um editor inteligente, depois de ver o que fez nessa HQ do Motoqueiro, não daria novamente um título mensal para ele. As páginas são extremamente confusas, escuras demais, com diagramação ruim além de ser dono de um desing sofrível, tanto para equipamentos (como a cadeira de rodas de um dos personagens principais) como para o demônio vilão da história, que não passa de um monte de carne desconexa.
Voltando a falar mal de Ennis, ele recheia a história com personagens descartáveis, como o “bunda-na-fuça”, que de tão intragável me faz começar a ter raiva até do “Cara-de-cu” (esse sim, um personagem bacana, criado por ele em Preacher. Só fiz a comparação porque existe certe semelhança semântica) ou o padre Adam, recrutado (pelo céu ou pelo inferno? nem lembro mais) para dar cabo do Motoqueiro Fantasma...
Nem a escatologia típica do Ennis, nem seu texto pagão, criticando Deus e o Diabo, conseguem salvar “Estrada para a Danação”. O autor coloca anjos e demônios na mesma balança, numa tentativa infantil de anular o maniqueísmo de sua obra. Parece um adolescente ateu tentando chocar os pais ortodoxos. 
É extremamente decepcionante alguém escolher uma história como essa para colocar no que chamaram de “coleção oficial de Graphic Novels da Marvel”... Will Eisner, que cunhou o termo graphic novel, deve estar se revirando no túmulo.
No único momento que vale a pena do quadrinho, tem um anjo sentado na lua olhando para a Terra cheia de humanos e diz: “devíamos ter ficado com os dinossauros”. Então vejo minha situação, sentado na cama, olho pra esse álbum da Salvat e penso: “devia ter lido minha Tex”.


P.S: Quase tão ruim quanto Guerra Secreta, de Brian Bendis.