sexta-feira, 28 de novembro de 2008

O Quadrinhista Caio "Zed" Thiago

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Caio Thiago de Andrade Oliveira nasceu em 1979. É natural de Piripiri – Piauí, segundo filho do bancário Simplício Mário e da professora e funcionária pública, Maria dos Remédios. Desde criança sempre leu quadrinhos, antes mesmo se alfabetizar. Seu pai presenteava a ele e a seus dois irmãos (Isaac Bruno e Bernardo Aurélio) com várias revistas, principalmente de super-heróis: Homem-Aranha, Hulk, Super-Homem, entre outros. Incentivado pela leitura e pelo ambiente em que foi criado, se tornou um expoente da arte seqüencial no Estado. Thiago defende a participação do pai na construção desta sua personalidade artística:

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Normalmente os pais acham que o filho tem que ser um médico, um advogado, como minha mãe acha. Meu pai sempre achou bacana esse lance de eu querer viver da minha arte. Os pais esperam que os filhos façam o que não fizeram. “Meu filho quer viver de arte”. Isso é muito pra ele. Pelo menos eu acho... (THIAGO. 2008).

O pai sempre foi envolvido com o meio cultural de Piripiri, participou de um grupo chamado “Balaio”, onde se escrevia, lia e atuava. A casa em Piripiri, hora ou outra, hospedava pintores, atores e músicos que visitavam a cidade. Sempre houve uma aproximação artística dos filhos com estes representantes da cultura local. O pai envolvia-se: pintou, escreveu e atuou, mas pôde continuar tentando.
A mãe, quando percebeu o profundo envolvimento do filho com a arte das histórias em quadrinhos, como toda boa mãe, preocupou-se com o futuro do filho, já que o cenário profissional de artistas na área do desenho, mas especificamente para os quadrinhos, não é muito promissor. Então, a mãe sempre incentivou que o filho realizasse outros trabalhos e estudos. Em 1996, Thiago participou de um concurso no qual foi premiado. Na ocasião, a mãe, que sempre fora preocupada, mandou uma carta para o jornal O DIA1:

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"Segunda-feira, dia 26 / 08, lendo “O Dia”, na página 19 do “Torquato”, vi algo super interessante. Um jovem médico, Dr. Willdaves, fã de quadrinhos, desenha e escreve as emoções de uma coisa que até então achava “anormal e infantil” para meu filho, Caio Thiago, de 17 anos (pois ele faz o mesmo que o Dr. Will). Caio Thiago concorreu com os leitores da revista Comics Generation de todo o Brasil e ganhou o 1º lugar com a promoção “Batmix”. Maria.

Ok. D. Maria. Achamos o trabalho de seu filho legal e acreditamos que, se ele praticar mais, poderá vir a ser um dos talentos que o estúdio Artecomix está exportando. Agora, essa coisa de que ler quadrinhos é “anormal e infantil” já foi superada há muitas décadas. Tratava-se de um preconceito bobo e sem bases reais, que ruiu com estudos sérios e bem fundamentados de pesquisadores dos fenômenos da cultura de massa (MACHADO. 1996)."

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Este texto nos revela o quanto parecia difícil para a mãe ver o filho inundado cada vez mais em um universo onde não enxergava expectativas profissionais, mas apenas uma visão preconceituosa que surgiu com força na década de 50, quando os quadrinhos eram o maior produto de consumo de massa entre as crianças de todo o mundo e especialistas, ou psicólogos como o Dr. Fredric Wertham no livro “Sedução do Inocente”, imortalizaram crenças erronias contra este tipo de leitura.

Willdaves Machado apresenta para Dona Maria a possibilidade de um mercado estrangeiro se Thiago continuasse treinando. De certa forma, este concurso simples, no qual foi premiado apenas com três bonecos do Batman, foi uma maneira dos seus pais e irmãos enxergarem que, apesar da pouca idade, Thiago começava a se destacar naquilo que fazia e que poderia ser realmente um profissional. Entretanto, a vida continuava. Quando entrou em uma universidade, em 2000 pela UESPI, estudou Licenciatura Plena em Inglês, pois intencionava fazer um intercâmbio e morar nos Estados Unidos ou Japão, nunca pensando em lecionar, mas sim facilitar seu diálogo com o mercado estrangeiro de produção de quadrinhos. As únicas aulas que chegou a ministrar foi no período de prática de ensino, o qual é obrigatório para a conclusão do curso.

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Chegou a iniciar um curso técnico de artes no CEFET, mas não o concluiu, pois não conseguia se envolver com outros tipos de manifestações culturais que não fossem o desenho voltado exclusivamente para a arte seqüencial dos quadrinhos. Chegou a ser funcionário público durante quase dois anos na SEDUC, onde realizava trabalhos burocráticos e conseguia grana para comprar mais quadrinhos e jogos de vídeo game, outra grande paixão em sua vida.

“Meu pai foi o grande mecenas da minha vida”, disse Thiago em entrevista. “Ele que me patrocinou”. Em 2006, com a ajuda do pai e incentivado pela família, Thiago foi morar em São Paulo para fazer um curso em uma das poucas academias de ensino desta arte no país: a Quanta Academia de Artes. Foi lá que conheceu Marcelo Campos, o primeiro brasileiro a trabalhar profissionalmente numa grande editora dos Estados Unidos. Neste ano e meio que ficou em São Paulo, conheceu outros grandes representantes dos quadrinhos nacionais em produção hoje, foi aluno de Octavio Carrielo, de Greg Tocchine, dos irmãos Fábio Moon e Gabriel Bá. Durante esse período foi a um festival de quadrinhos onde assistiu a uma palestra de Ivan Reis, desenhista do principal título do Super-Homem nos Estados Unidos e freqüentemente listado entre os melhores desenhistas do mercado norte-americano. Muitos dos professores e inclusive o próprio Marcelo Campos, disseram que seu trabalho já estava profissional e que deveriam, ao invés de ensiná-lo, agenciá-lo. Foi nessa escola que conheceu Vitor Ishimura, um dos professores que vendeu os primeiros trabalhos de Thiago para o exterior, mais especificamente para o editor independente Mike Kennedy. O trabalho era, a princípio, uma ficção científica chamada Prism, onde Thiago faria apenas cinco páginas, que viraram vinte por causa do editor norte-americano ter gostado do seu traço.

Atualmente, o editor Mike Kennedy leu um trabalho autoral de Thiago em produção, chamado Super-Ego, e se agradou do produto. Pretende agenciar este projeto e vender para alguma editora norte-americana, como a Dark Rorse ou Image, editoras que estão entre as cinco maiores nos Estados Unidos. Agora estão trabalhando juntos e é a grande expectativa profissional de Thiago, que produz em casa visando o mercado externo pois não consegue enxergar espaço no raquítico cenário nacional.

Nesse período que passou em São Paulo, morou em um apartamento com dois estudantes da Academia Internacional de Cinema. Foi uma experiência interessante aonde chegou a produzir estudos de figurino para os curtas-metragens que os colegas de quarto produziam. Também realizou storyboards de algumas cenas. Segundo Thiago, “assim como Frank Miller (Sin City), também já ‘trampei’ com cinema”, onde, na verdade, os quadrinhos se encaixam muito bem, tanto que, Eduardo Sertório, um dos colegas, pediu autorização para adaptar uma história em quadrinhos do Thiago para cinema. A experiência levou Thiago inclusive ao set de filmagem, fazendo figuração e “morrendo” logo na primeira cena. A obra intitulada “Sobre a ponte” tornou-se “Hattari” e foi premiado como “o melhor filme universitário de São Paulo” em 2007.
Em 2008, através do fórum do site Multiverso Bate Boca (MBB), ficou sabendo e participou do concurso Comic Book Idol, uma espécie de programa “Ídolos” dos quadrinhos divulgado na Internet. Foram centenas de concorrentes de onde foram selecionados apenas um brasileiro, seis estadunidenses, dois ingleses e um canadense. Os concorrentes produziam, semanalmente, algumas páginas seguindo um roteiro comum a todos. Um por um os concorrentes foram eliminados através de votos dos internautas. Thiago chegou à semi-final. Infelizmente, ainda não foi daquela vez.
Entretanto, bem antes disto, quando ainda era criança, Thiago teve outras histórias curiosas de serem contadas, como o já citado envolvimento com o mundo dos Vídeo Games. A princípio, teve um Atari, que não o estimulou o suficiente, apenas anos depois, no início de 1990, quando os filhos foram presenteados pelos pais com um Mega Drive, que o mundo dos jogos começou realmente a fazer sua cabeça. A atenção voltada para o console plugado na TV era tanta que ele e os irmãos deixaram de colecionar gibis e toda a mesada era voltada para a compra de novos cartuchos, de novos jogos. Engana-se quem pensa que isso foi um fator negativo para a produção de Thiago. Naquela época, primeira metade da década de 90, praticamente não havia quadrinhos japoneses nas bancas de revistas. O mangá era algo muito exótico, entretanto, o traço dos desenhos japoneses era muito utilizado no caráter desing dos personagens dos jogos. Thiago pôde ser influenciado pelo mangá através do vídeo game antes mesmo das revistas impressas, que só vieram se popularizar em 1994 com a exibição de Cavaleiros do Zodíaco na TV e depois do ano 2000, com o título Dragon Ball nas bancas.

O jogo de luta chamado Street Fighter foi uma das principais influências. Thiago chegou a produzir uma releitura dos personagens, inspirado pela adaptação do jogo para o cinema, a qual achou tão ruim que acreditava conseguir fazer melhor. Thiago criou uma trama de quase oitenta páginas. É a primeira história em quadrinhos longa que chegou a produzir.
Apenas em 1992 Thiago volta a ler e colecionar quadrinhos. Na época, a editora Abril lançou a primeira edição de Homem-Aranha 2099, desenhada por Rick Leonard que foi o artista responsável pelas novas influências no traço de Caio Thiago, segundo o próprio.

Thiago acredita que seu estilo não é muito comercial, “não é modinha”. Segundo ele, muitos professores da Quanta e o próprio Mike Kennedy acham que trata-se de um “estilo particular que me impede de entrar no mercado. Não consigo copiar traço dos outros”. Mesmo acreditando nisto, é sempre impossível negar as inspirações externas e Thiago coloca bem a lista dos artistas que se seguem depois de Leonard: a narrativa do mangá (independente de um artista em particular), Eduardo Risso (de 100 Balas), Frank Quitely, Alan Davis, Keith Gifen, Cláudio Castelinne e vários desenhistas dos fumetti (quadrinhos italianos), como Ivo Milazzo (Ken Parker) que admira, pois acredita que o mercado italiano é surpreendente pela qualidade geral dos seus artistas e pelo próprio ritmo de produção europeu, muito voltado para álbuns longos, onde o artista, às vezes, pode se dedicar um ano inteiro a um único trabalho, diferente do mercado norte-americano, onde acredita que existem muitos profissionais ruins ou abaixo da média.

Thiago acredita que trabalha muito “mais por diversão do que por qualquer outra coisa. Fico muito envaidecido se alguém vê o que eu produzo como arte”. Apesar da modéstia, enxerga a produção industrial dos quadrinhos, assim como no cinema, uma manifestação legítima de arte, coletiva ou não, e não se incomoda com a possibilidade de produzi-la para um mercado de entretenimento cultural.

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